A menos de um mês das eleições no Brasil, o politólogo Miguel Borba Sá alerta que as sondagens são incertas e que os resultados de 2 de outubro podem surpreender.
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Naquelas que são descritas por Miguel Borba de Sá, professor da Universidade de Coimbra, como as eleições "mais atípicas do Brasil", a perceção do que será o futuro do país nos próximos quatro anos permanece uma incógnita. No dia em que se assinalam os 200 anos da independência do Brasil, as clivagens são evidentes, e apesar de a mais recente sondagem da Datafolha, publicada a 2 de setembro, indicar que o ex-presidente Lula da Silva reúne 45% das intenções de voto, enquanto Jair Bolsonaro arrecada apenas 32% - o que, a acontecer, empurraria os candidatos para uma segunda volta -, o investigador alerta que "as sondagens nem sempre estão certas".
Embora o candidato do Partido dos Trabalhadores se tenha vindo a destacar em detrimento do atual presidente, Borba de Sá ressalva que nada está definido e explica que "as sondagens não são capazes de captar todo o eleitorado de Bolsonaro, pois há sempre uma margem de cerca de 4% de eleitores que não admite que vota no candidato, por vergonha".
Numa altura em que a "corrida eleitoral está longe de estar decidida", o especialista em política brasileira deixa em aberto a possibilidade de qualquer um dos candidatos ocupar o lugar no Palácio do Planalto e antecipa que, caso Bolsonaro conquiste um segundo mandato, deverá optar por uma abordagem política mais radical, que poderá passar por "questionar as bases da Constituição brasileira", na tentativa de "almejar um terceiro mandato".
Ao colocar a hipótese de uma vitória de Lula de Silva, o politólogo mostra-se preocupado com a primeira fase pós-eleitoral, na qual acredita que "Bolsonaro tentaria executar movimentações para manter o bolsonarismo vivo". Ainda assim, o especialista não acredita, ao contrário do que tem sido especulado pela imprensa brasileira, que o atual presidente coloque em marcha um evento semelhante ao que ocorreu no Capitólio dos EUA, em janeiro de 2021.
O professor, que lecionou na Universidade Federal de Santa Catarina, em Florianópolis, mostra-se crítico em relação aos dois candidatos que se destacam entre os 12 na corrida eleitoral. No caso de Bolsonaro, Borba de Sá admite temer o "aprofundamento das posições bolsonaristas" que têm gerado controvérsia no país, porém, também não perspetiva em Lula da Silva a imagem de "salvador da pátria que o ex-presidente quer tentar passar".
"Não me parece que o Governo de Lula possa reconstruir aquilo que foi destruído nos últimos anos. Essa ideia passada por Lula de que as pessoas vão voltar a comer picanha e beber cerveja no fim de semana não é uma promessa fácil de cumprir", constata.
A menos de um mês das eleições e no dia em que se celebra o bicentenário da independência, Borba de Sá sublinha que aquela que deveria ser uma ocasião de celebração poderá ficar marcada por "situações de violência", que podem ser consequência "dos discursos de ódio que estimulam cidadãos comuns a cometer crimes".
"Risco de violência política"
Carlos Andreazza, jornalista e colunista do jornal "O Globo", acredita que a ocorrência deste tipo de situações é provável no dia do bicentenário do Grito do Ipiranga e, em artigo de opinião, escreve: "O 7 de setembro [...] balizará, já amanhã [hoje] à noite, as análises políticas sobre as possibilidades competitivas do presidente candidato".
Como método preventivo, o Supremo Tribunal Federal suspendeu ontem, temporariamente, medidas que facilitam a venda de armas ao longo da campanha eleitoral, por haver "risco de violência política", justificou o juiz Edson Fachin.
Sondagem
45% das intenções de voto é o que o candidato Lula da Silva consegue arrecadar na mais recente sondagem da Datafolha, publicada a 2 de setembro, contra os 32% conquistados pelo atual presidente, Jair Bolsonaro.
Perfil
Idade: 67 anos
Partido: Partido Liberal
Em 2018, Jair Bolsonaro candidatou-se à presidência encabeçando a coligação "Brasil acima de tudo, Deus acima de todos", mas a campanha eleitoral ficou marcada por um ataque, a 6 de setembro, no qual o político foi esfaqueado por um opositor. Os ideais conservadores do candidato levaram-no a derrotar Fernando Haddad na segunda volta, com 55,13% dos votos. De olho num segundo mandato, o presidente tem agora acenado com benesses para ter a simpatia dos eleitores, mas a luta pelo poder poderá ser renhida.
Idade: 76 anos
Partido: Partido dos Trabalhadores
Entre 2003 e 2011, Lula foi presidente do Brasil, mas sete anos depois viveu um dos piores momentos da sua vida. Foi condenado a nove anos e seis meses de prisão por estar envolvido na operação Lava Jato. Porém, ao fim de 580 dias, foi libertado, após o Supremo Tribunal Federal (STF) reconhecer o direito de aguardar em liberdade até o julgamento de último recurso. Em 2021, o STF anulou as condenações por considerar que foram decididas por um tribunal que não tinha competência para julgar o caso, abrindo caminho para a recandidatura à presidência.