Mais de uma dezena de associações consideraram inaceitável e inconstitucional a lei da eutanásia pela possibilidade de exclusão da família dos procedimentos de antecipação da morte de um dos seus membros.
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Em comunicado, 14 associações de apoio à família adiantam ter enviado uma posição conjunta sobre o assunto ao presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, a pedir uma audiência, e ao presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, com pedido de distribuição a todos os deputados.
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As associações entendem que a lei da eutanásia não prevê a participação, envolvimento e informação obrigatórios dos familiares do doente no procedimento administrativo de antecipação da morte deste, limitando a possibilidade de os profissionais de saúde, caso o doente não os autorize, a contactarem/dialogarem com os familiares deste.
Por isso, consideram que a lei "viola expressamente, entre outras disposições, o artigo 67.º da Constituição da República Portuguesa, não sendo conforme com o nível de tutela e proteção da família e das famílias previsto na lei fundamental do país".
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"A Constituição da República Portuguesa, em linha com o Direito Internacional, reconhece, no artigo 67.º, a família como elemento fundamental da sociedade, e estabelece que a família tem direito à proteção da sociedade e do Estado e à efetivação de todas as condições que permitam a realização pessoal dos seus membros, atribuindo ao Estado, para proteção da família, a tarefa de definir e executar uma política de família com caráter global e integrado", destacam as associações.
Segundo as associações, na lei da eutanásia é feita uma única referência à família ou familiares do doente, a propósito dos deveres dos profissionais de saúde estabelecendo-se que os médicos e outros profissionais de saúde que intervenham no procedimento de antecipação da morte (só) têm o dever de dialogar com os familiares do doente que pede para morrer se para tal forem autorizados pelo doente.
Na posição enviada esta quinta-feira, as subscritoras declaram que "um Estado que aprova e promove políticas de prevenção do suicídio e que tem a obrigação, constitucional e legal, de prestar cuidados de saúde primários, continuados e paliativos a todos os cidadãos que deles necessitam, não pode excluir a família de um procedimento que é destinado a terminar com a morte de um dos seus membros."
No mesmo documento, as associações sublinham que "não é aceitável" que "os familiares mais próximos do doente que pede para morrer possam vir a ser surpreendidos e confrontados com a morte do seu familiar, sem terem hipótese de ajudar, apontar outro caminho ou, no limite, de o acompanhar nesse momento."
"Isto é tanto mais difícil de aceitar quando se sabe que, muitas vezes, a família pode estar, de alguma forma, associada à própria decisão do doente de avançar para a antecipação da própria morte: pensemos, por exemplo, nas angústias ligadas a ser um 'peso para a família' (ou outras semelhantes), que só com intervenção dos familiares podem ser ultrapassadas ou resolvidas", destacam.
No entender das associações, "um Estado que aprova e promove políticas de prevenção do suicídio e que tem a obrigação constitucional e legal de prestar cuidados de saúde primários, continuados e paliativos a todos os cidadãos que deles necessitem, não pode excluir a família de um procedimento que pode (e é destinado) a terminar a morte de um dos seus membros".
A posição é subscrita pela Associação Família e Sociedade, Associação Portuguesa de Famílias Numerosas, Associação Portuguesa de Síndrome de Asperger, Associação de Defesa e Apoio à Vida de Aveiro, Associação de Defesa e Apoio à Vida de Coimbra e Associação de Defesa e Apoio à Vida de Viseu.
A Associação Famílias Diferentes, Associação Famílias, Centro de Orientação Familiar, - Confederação Nacional das Associações de Família, Famílias Novas, Fundação LIGA, Infamília e Novamente - Associação de Apoio aos Traumatizados Cranioencefálicos e suas famílias são outras das signatárias.
Em 21 de janeiro, a lei da morte medicamente assistida foi aprovada, na especialidade, na comissão de Assuntos Constitucionais, com os votos favoráveis do PS, BE e PAN, o voto contra do CDS-PP e PCP e abstenção do PSD.
Apesar de votar contra a lei, a bancada do CDS só aprovou os artigos que garantem o direito à objeção de consciência e sobre os cuidados paliativos.
O trabalho na especialidade resultou em alterações pontuais, como detalhar melhor as condições em que a morte medicamente assistida não é punida.
"Considera-se eutanásia não punível a antecipação da morte por decisão da própria pessoa, maior, em situação de sofrimento extremo, com lesão definitiva, de gravidade extrema, de acordo com o consenso científico, ou doença incurável e fatal, quando praticada ou ajudada por profissionais de saúde", de acordo com a redação final aprovada.