Na última década, 24 pessoas cometeram suicídio com pentobarbital, uma substância cuja utilização em seres humanos é proibida em Portugal e que é a mais utilizada no suicídio assistido nos países onde esta prática está legalizada há anos.
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De acordo com os dados fornecidos ao JN pelo Instituto de Medicina Legal (IML), 10 mortes aconteceram em 2019, um número que duplicou face a 2018, ano em que se registaram cinco casos (um na Região Centro e quatro no Sul).
É precisamente na Delegação Sul do IML que se verificaram o maior número de casos - 15 dos 24 contabilizados entre os anos de 2009 e 2019. Na Delegação Norte houve oito casos no total e na Delegação Centro apenas um. Em causa estão mortes em que as autópsias revelaram a presença no organismo de um fármaco que atua ao nível do sistema nervoso central, afetando as funções respiratória e cardíaca.
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Fausto Amaro, presidente da Sociedade Portuguesa de Suicidologia, admite que "a probabilidade de ocorrência de suicídios aumenta se não houver controlo dos meios letais. Isto significa que, se estivermos a trabalhar numa ótica de prevenção do suicídio, devemos exercer o máximo controlo sobre a disponibilidade de substâncias usadas como meio letal", defende.
O IML não dispõe de dados sobre a existência de patologias nos casos em que se confirmou que o óbito decorreu da ingestão de pentobarbital. Há, no entanto, no entender do sociólogo, uma relação direta entre estes números e o sofrimento ou a intolerância a este.
"Nas sociedades contemporâneas tem aumentado o número de pessoas com atitudes favoráveis ao suicídio assistido e este fenómeno está relacionado com uma maior exposição das pessoas em sofrimento aos diversos meios que difundem este tipo de atitudes", considera.
Olhando para a evolução anual, verifica-se em Portugal um aumento do recurso a esta substância para morrer nos últimos três anos: em 2017 houve dois casos; em 2018 cinco casos e em 2019 duplicou para 10 casos (três no Norte e sete no Sul).
Tal como existe noutras formas de suicídio, em que se aponta para uma subnotificação dos casos na ordem dos 20%, também no caso do uso de fármacos como o pentobarbital ou semelhantes, haverá casos não referenciados.
"Muitas vezes as autópsias deixam dúvidas e, não havendo a certeza de que se trata de suicídio, classifica-se o óbito como tendo ocorrido por outras causas ou por causa indeterminada", explica Fausto Amaro. O estigma associado ao suicídio faz com que haja a "tendência para esconder os factos pela família".
Só a existência de "mais recursos" poderia solucionar os casos mais duvidosos, diz.
ILEGAL
Droga à venda na Internet por 500 euros
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Há dezenas de endereços eletrónicos que vendem pentobarbital e o enviam para uma morada em Portugal, por cerca de 500, 600 euros, conseguindo passar todos os controlos fronteiriços.
A substância, utilizada na medicina veterinária para a eutanásia animal, é também vendida em sites fraudulentos que burlam os compradores em centenas de euros. Os clientes pagam por frascos e comprimidos que nunca chegam. A utilização desta droga em humanos está limitada aos países que legalizaram a morte assistida e aos EUA, onde serve para aplicar a pena de morte.