Estrangeiros ávidos por portugueses para teletrabalho. Propostas triplicam salário e deixam firmas nacionais sem talentos.
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O problema não é recente, mas agravou-se muito com a globalização do teletrabalho decorrente da pandemia. Há cada vez mais engenheiros informáticos a trabalhar a partir de Portugal para empresas estrangeiras que chegam a pagar o triplo do salário, o que reduz a competitividade das tecnológicas portuguesas, que não conseguem acompanhar os níveis salariais das potências europeias. Os centros de investigação também não têm capacidade para segurar os talentos.
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A globalização do mercado tecnológico veio para ficar e o teletrabalho é uma realidade que não mais deixará de existir no meio digital. Os talentos da engenharia informática nacional são dos mais procurados lá fora e isso está a trazer problemas de competitividade às firmas e centros de investigação nacionais que não têm onde contratar e não conseguem reter os que já têm. A conclusão é das próprias empresas, mas também de consultoras de recrutamento qualificado e dos centros de investigação.
"Temos pequenas empresas a tentar competir com grandes marcas para reter talentos", constata Mário Rocha, Senior Manager na Hays Portugal, que não tem dúvidas que neste momento o principal desafio para empresas tecnológicas portuguesas "é a elevada procura por estes talentos aliada à sua fraca disponibilidade a curto prazo".
A consultora de recrutamento Robert Walters concluiu que, devido à pandemia, oito em cada dez novos contratos laborais no setor tecnológico em Portugal têm pelo menos alguns dias de teletrabalho por semana e, destes, quase metade é para um regime completamente remoto. "Os porta-vozes dessas empresas explicam que o aumento das ofertas remotas foi motivado pela pandemia, mas não será temporário", destaca a consultora.
Remoto veio para ficar
A Robert Walters afirma que os perfis para os quais as opções remotas mais aumentaram são os programadores de software, engenheiros DevOps, cientistas de dados, especialistas em cibersegurança e engenheiros de Cloud. Nestes casos, aliciar os engenheiros portugueses é fácil, pois as propostas triplicam-lhes o salário e eles continuam a trabalhar a partir de casa.
Recrutados já nos cursos
O portal Glassdoor, que reúne uma base de dados anónima sobre salários médios de várias profissões em todo o Mundo, calcula que o rendimento médio anual de um engenheiro de software júnior em Lisboa é de 21 500 euros. Em Londres, é de 62 400 euros, quase o triplo.
O excelente nível de formação dos engenheiros informáticos portugueses também potencia a "caça ao talento", mesmo durante o período de formação. Há cada vez mais empresas com programas de estágios curriculares remunerados que promovem o primeiro emprego em part-time ou full-time durante as licenciaturas, na esperança de que os candidatos fiquem depois de terminarem o curso. Isto deixa sem talentos os centros de investigação, pois estes são, em muitas áreas, o local de transição entre o mundo académico e o laboral.
A generalização do teletrabalho também permite que as empresas portuguesas contratem lá fora e, neste caso, o Brasil tem sido um dos países preferidos. Ainda assim, todos são unânimes em dizer que entre o talento perdido e o contratado, as empresas portuguesas acabam por ficar a perder, pois a formação académica nacional é de excelência e há mais países com falta de mão de obra do que com excesso.