Os professores Pedro Silveira, de Ciência Política, e Viriato Soromenho-Marques, de Filosofia Política, analisam as palavras endereçadas pelo presidente da República ao Governo, respondendo a três questões.
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1 - O presidente da República fez bem em não dissolver a Assembleia da República nem demitir o Governo?
2 - Acha que os avisos vão resultar em mudanças na exigência que o primeiro-ministro tem sobre os ministros?
3 - A relação entre o primeiro-ministro e o presidente da República está definitivamente comprometida?
Pedro Silveira, professor de Ciência Política
1. Era a posição expectável porque as outras duas eram ainda piores. Não sendo a posição ideal para o presidente, que fica fragilizado na autoridade política, as outras duas seriam bastante piores porque colocavam em causa tudo o que tinha dito desde o início do mandato. Não sei se é uma boa solução, o tempo dirá, mas era a mais plausível.
2. O presidente vai continuar a ser ouvido pelo Governo, mas podemos todos questionar em que medida é que continua a ter uma capacidade efetiva e consequente. Ser ouvido não é a mesma coisa do que ter uma palavra consequente a dizer. Acho que o presidente fica fragilizado nesse sentido, passa a ser difícil.
3. O próprio presidente assume que a relação será diferente, mas isto não é necessariamente incompatível com a normalização da relação institucional. Ou seja, não me parece que haverá uma guerra institucional e grande atrito porque não é bom para nenhum deles e não é bom para o país. Mas significa que haverá uma nova fase. Vamos ver qual é a postura do Governo.
Viriato Soromenho-Marques, professor de Filosofia Política
1. Penso que fez bem. Acabou por ser uma repreensão muito bem feita. Porque a intervenção do primeiro-ministro foi particularmente dura. Na minha opinião houve ali uma encenação com a demissão de João Galamba e dissolver a Assembleia seria um sinal de irritação, de irreflexão do presidente. E podemos pensar se não seria isso que o próprio primeiro-ministro queria.
2. Não sei, porque o primeiro-ministro tem feito o contrário de tudo aquilo que prometeu, como reconciliar os portugueses com a maioria absoluta. Tem mostrado alheamento. Parece não estar a prestar muita atenção e está a deixar aqueles ministros "compangons de route" em roda livre. Isto vai ser um teste para quem lá está. Se eu fosse ministro, não me sentia bem no Governo, no mesmo grupo do Galamba.
3. Tudo depende. Eu julgo que o perfil psicológico de ambos convida a ter pelo menos o benefício da dúvida. Da parte do presidente da República, não tenho dúvidas que se recupera, mas quem tem de fazer o trabalho de casa é o primeiro-ministro.