
Marcelo Rebelo de Sousa lamenta "envelhecimento coletivo imparável"
Foto: Carlos Carneiro
Na última mensagem de Natal para o Jornal de Notícias antes de deixar o cargo, o presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, evoca Jorge Sampaio para apelar a uma maior tolerância.
Num texto de opinião intitulado "Os nossos muros ou a lembrança de Jorge Sampaio", o mais alto magistrado da Nação lança um olhar sobre o impacto da época festiva nos diferentes quadrantes da sociedade portuguesa, repetindo os apelos à tolerância e ao respeito pela dignidade humana que têm marcado as mensagens nos anos do seu mandato em Belém. Num contexto político e social de enorme fragmentação e crispação, o mais alto magistrado da Nação evoca Jorge Sampaio, antigo homólogo, para discorrer sobre a dimensão dos muros que hoje ameaçam dividir os portugueses.
Marcelo recorda o ano de 1989, quando ele e Jorge Sampaio concorriam à Câmara de Lisboa, no mesmo ano em que tombou o muro de Berlim. "E eu sublinhei esse momento decisivo na História contemporânea - e que viria a substituir as duas superpotências de décadas pelas duas superpotências de hoje, com a que deixou de o ser a nunca desistir do sonho do que fora. E converti o momento, em sinal para o futuro, também de Portugal", escreve o presidente, que não esqueceu o que Jorge Sampaio lhe disse depois: "Mais importantes do que o muro de Berlim são os muros que existem na nossa terra".
Ora, de acordo com Marcelo, o tempo veio a dar razão ao seu antecessor no cargo. "Eu tinha razão ao falar no muro de Berlim. Nos muros lá de fora, que são cá de dentro. Inevitavelmente. Só que Jorge Sampaio tinha razão ao evocar os muros nascidos e agravados cá dentro. E que, alguns deles, não pararam de se agravar", sublinha ainda o presidente da República.
Esses muros assumem, entre outras,. a forma de fragilidades sociais. A pobreza, o envelhecimento coletivo. "A pobreza já foi mais grave e já foi menos grave. Mas nunca deixou ser grave demais para o todo nacional que somos. Antigos muros caíram. Novos muros se ergueram. Pobreza com envelhecimento coletivo imparável. Menos jovens a ficarem e mais gerações antigas a entrarem em becos sem saída", exemplifica, para deixar uma palavra de esperança. "O mais avisado talvez seja, neste Natal, revermos o rol dos muros mais urgentes de superar. Sem respondermos a um muro com outro muro. Que os muros tendem a alimentar-se de outros muros. E isso não cria esperança, alimenta condomínios fechados de egoísmos em que só alguns têm direito a o Natal.".
Esta é a última mensagem de Natal de Marcelo Rebelo de Sousa no Jornal de Notícias antes de abandonar o cargo de presidente da República. Uma tradição que, durante anos, marcou a agenda política do dia de Natal. Desde 2017 que o faz, apenas tendo interrompido esta prática em 2022 e 2023.

