A Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais contra Crianças na Igreja Católica apresenta, esta manhã, o relatório final do trabalho realizado durante um ano.
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No seu último balanço, revelou que tinha recebido 424 testemunhos validados que envolvem mais de uma centena de sacerdotes. Nuno Caiado, primeiro subscritor de uma carta aberta à Conferência Episcopal Portuguesa a pedir uma investigação independente a estes abusos, disse ao JN que espera que haja "uma reflexão de todos os católicos, que não se podem conformar com estes crimes".
São hoje conhecidos quantos crentes abusados sexualmente pela Igreja, em Portugal, apresentaram denúncia à Comissão Independente e quais as recomendações que o grupo de trabalho fará à Conferência Episcopal. Após um ano de recolha de testemunhos, Nuno Caiado diz que "muitos católicos aguardam com muito interesse e angústia o relatório" e espera que as medidas sugeridas pela Comissão "sejam um incentivo para mudanças". Apela ainda aos católicos para que "não se conformem com estes crimes e não descansem com as comissões diocesanas de prevenção".
No último ano, foram várias as denúncias que vieram a público, um pouco por todo o país, de mais de uma centena de sacerdotes ainda no ativo. Se, por um lado, predominou o silêncio de algumas instituições religiosas depois de serem confrontadas com as queixas, também alguns sacerdotes foram afastados temporariamente das paróquias e um padre assumiu "uma relação consensual" de prática de abusos sexuais de um menor.
"houve encobrimento"
A posição de "um setor da Igreja Católica que quer manter segredos", apesar da "tolerância zero" aos abusos decretada pelo Papa Francisco, levou o coordenador da Comissão Independente, Pedro Strecht, a fazer um apelo à instituição para recusar "a ocultação da ocultação". O pedopsiquiatra admitiu ainda que se tornou "muito claro que houve encobrimento da hierarquia católica em Portugal".
Nuno Caiado diz que "a hierarquia (da Igreja) parece ainda atónita". "Todos temos medo de ser postos em causa, mas seremos mais se não reconhecermos a culpa, se não pedirmos desculpa sincera às vítimas e se não invertermos as condições para prevenirmos mais abusos", considerou. Para o também especialista em reinserção social, "estes crimes não são casos perversos isolados, mas sinal e sintoma de uma organização humana que perdeu de vista o essencial - Jesus Cristo - e onde o clericalismo se tornou dominante com o inerente abuso de poder".
Para Nuno Caiado, "se não mudarmos este modelo de igreja centrado num padre, erradamente tido como representante de Deus, não mudaremos as suas consequências". "Tenho esperança de que os bispos colaborem nesta enorme tarefa de mudança".
Maria, nome fictício, vítima de abuso sexual diz que está "muito curiosa" pelos resultados do relatório da Comissão. "Não me interessa saber os números porque não têm nada a ver com a realidade, quero saber quais são as medidas que vão apresentar à Conferência Episcopal. Se lhe for dada a opção de escolha, acho que há dioceses que não vão fazer nada".