Neste Dia Mundial do Coração, João Jácome de Castro, presidente da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo (SPEDM), desafiou as pessoas com excesso de peso e obesidade a perderem alguns quilos para ganharem anos de vida, apontando que a perda de 5% a 10% do peso corporal é o suficiente para trazer benefícios extraordinários.
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"As doenças cardiovasculares são a principal causa de morte em Portugal. As pessoas com obesidade vivem, em média, menos sete anos que as pessoas sem obesidade, um fator de risco para desenvolver diabetes, hipertensão, doença cardíaca, AVC, doenças osteoarticulares e até cancros. No fundo, temos de ver a obesidade como um grande problema da sociedade", alertou João Jácome de Castro, em declarações ao JN, a propósito do Dia Mundial do Coração.
Para João Jácome de Castro, a perda de peso das pessoas com excesso de peso e obesidade é fundamental para a melhoria da saúde destas e para a diminuição de comorbilidades associadas à doença. "Nós sabemos hoje que as pequenas perdas de peso podem ser extraordinariamente importantes. Se uma pessoa com obesidade perder 5% a 10% do peso corporal já tem benefícios extraordinários no risco de vida. Diminuem-se as diabetes, a hipertensão, a mortalidade por doença cardíaca ou por AVC, mas também os custos. Apesar do preço dos medicamentos, se eu perder peso, vou ter menos hipertensão, gastar menos dinheiro nos anti-hipertensivos, ter menos internamentos nos hospitais e fazer menos coronariografias. Tudo isto é uma poupança brutal", afirmou.
60% da população tem excesso de peso
O presidente da SPEDM apontou que, em Portugal, "mais de 60% da população adulta tem excesso de peso ou obesidade e mais de 10% tem diabetes, sendo que dentro da população diabética mais de 90% tem obesidade", doenças que disse serem das mais frequentes com um nível crescente a cada ano, fruto do estilo de vida dos portugueses. "Temos de desmistificar a tendência de que tratamos a obesidade, muito menos de quilos. Nós tratamos de pessoas que têm quilos a mais e que podem ter obesidade. Depois, associado à obesidade têm geralmente outras coisas como, desde logo, a doença cardíaca, ou um grupo de fatores de risco para a doença cardiovascular", explicou.
Em Portugal, desde 2004 que a obesidade é reconhecida enquanto doença crónica, seguindo a recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS), sendo o 4º país da OCDE e o 1º país da Europa com maior prevalência de excesso de peso e de obesidade, segundo os dados da Health at a Glance, de novembro de 2021. Em 2018, de acordo com o estudo "O Custo e a Carga do Excesso de Peso e Obesidade em Portugal", de outubro de 2021, mais de 46 mil pessoas morreram por doenças relacionadas com obesidade, o que representa 43% dos óbitos totais desse ano.
No dia em que se assinala a consciencialização da população a respeito dos problemas cardiovasculares, João Jácome de Castro defendeu que, se Portugal quer ver melhorias nas próximas gerações, tem de existir um investimento mais cedo na prevenção e no tratamento das pessoas que têm obesidade e diabetes. "Se investirmos nessas pessoas, o panorama das doenças cardiovasculares modificar-se-á radicalmente", defendeu.
Comer melhor e mexer-nos mais
Quanto à prevenção, João Jácome de Castro disse ser necessário um investimento na cultura da população portuguesa nos mais diversos níveis, passando pelas mudanças dos estilos de vida, desde o padrão alimentar à prática de atividade física: "Temos de comer melhor e temos de nos mexer mais e melhor". Acrescentou que não deixa de ser importante para a perda de peso as pessoas com obesidade "acreditarem que vale a pena comer de uma maneira diferente e aprendê-lo, e que têm a possibilidade de comprar alimentos saudáveis. Fazer exercício ao ar livre, nos parques, andar a pé, subir escadas, e habituar-se, claro, a alguns exercícios de força que permitam ter um organismo em bom estado e que o predispõem a um melhor aproveitamento da energia".
Na opinião de João Jácome de Castro, "neste momento vive-se uma altura muito feliz no tratamento das diabetes porque, finalmente, temos disponíveis medicamentos que são eficazes ou bastante eficazes e que são muito seguros", e outros "fármacos protetores do risco cardiovascular, que ajudam a perder peso, controlam as diabetes e previnem as doenças cardiovasculares", afirmou.
Relativamente a estigmas ligados à doença, dados de uma sondagem aos portugueses sobre obesidade de outubro de 2021, desenvolvida em conjunto pelo Jornal Expresso e a empresa GFK, pessoas com excesso de peso e obesidade já se sentiram discriminadas na escola (54%), em locais públicos (52%) e no trabalho (51%), existindo "mais casos de depressão nas pessoas com obesidade", como indicou João Jácome de Castro. "A saúde não é só não ter hipertensão e diabetes, é sentir-me bem e viver feliz. Muitas vezes desvaloriza-se a componente psicológica que é extraordinariamente importante na obesidade", defendeu.
O médico apela ainda à população portuguesa para o diagnóstico, uma vez que "muitas vezes o público não médico não trata a obesidade como uma doença". "As pessoas com obesidade têm de ser as primeiras a achar que se justifica fazer qualquer coisa para mudar o caminho das coisas, o que passa seguramente por ir ao médico", rematou João Jácome de Castro.