PS diz "não" a crime público para divulgação não consensual de conteúdos íntimos
O PS manifestou-se, esta quarta-feira, contra a possibilidade de qualquer pessoa denunciar a divulgação não consensual de conteúdos íntimos. "Não convergimos nas soluções, mas convergimos no diagnóstico", afirmou a deputada socialista Cláudia Santos, relembrando que as respostas penais atuais são "insatisfatórias". Chega (CH), Bloco de Esquerda (BE) e PAN também apresentaram propostas diferentes na forma, mas semelhantes na intenção de aumentar a pena para quem pratique o ato. Já a Iniciativa Liberal, PSD e PCP não apresentaram propostas no plenário desta tarde, mas mostraram abertura para debater qualquer proposta na especialidade.
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Na sessão plenária do final desta tarde, o Parlamento debateu e apreciou as propostas dos partidos para a criminalização da divulgação não consentida de conteúdos íntimos. Entre os projetos que foram apresentados, o PS recusou tornar o ato num crime público, ou seja um crime que qualquer pessoa pode denunciar mesmo que não esteja diretamente envolvida, visão contrária às das propostas apresentadas pelo PAN e pelo BE. Com esta opção, a bancada socialista pretende salvaguardar a liberdade de escolha da vítima em prosseguir com a denúncia ou não, sem deixar que seja um interveniente externo a decidir o curso dos acontecimentos naquilo que é um processo de grande pressão emocional.
"Não convergimos nas soluções, mas convergimos no diagnóstico", afirmou a deputada socialista Cláudia Santos, que descreve o aumento de pena proposto pelo PS (passar o crime de devassa da vida privada de um para até cinco anos de prisão) como sendo algo "absolutamente excecional". Acrescenta que o foco da proposta socialista não são os "crimes sexuais, como pretende o PAN", nem "a pornografia, como pretende o Bloco de Esquerda".
"O nosso assunto é mesmo a indiscrição e, por isso, achamos que deve ser tratado no âmbito do crime de devassa da vida privada, que não é um crime público", concluiu.
CH, BE e PAN também apresentaram projetos-lei no sentido de punir mais robustamente esta invasão à vida privada que, só em 2021, motivou a abertura de 770 inquéritos por parte da Procuradoria Geral da República, no âmbito de devassa da vida privada.
A proposta do PS contempla uma pena de prisão até cinco anos para quem dissemine, sem consentimento, imagens da vida familiar ou sexual. Além disso, prevê a paragem imediata da divulgação destas imagens ou vídeos, contando com a colaboração dos operadores intermediários por onde os conteúdos são partilhados. A deputada Cláudia Santos diz que caso não haja uma relação entre os dois envolvidos nos conteúdos divulgados, a situação constituirá apenas um crime de devassa da vida privada e não um crime de violência doméstica.
Debate na especialidade
Opinião da qual o CH não partilha. O líder do partido André Ventura criticou as diferenças estabelecidas pelo PS quanto ao estabelecimento do crime de devassa da vida privada, ao mesmo tempo que "lamenta" que nem a bancada social-democrata, nem a bancada liberal tenham apresentado propostas no sentido de acabar com este problema. Apesar disso, saudou a predisposição de todos os partidos para debateram todas as propostas na especialidade.
Ventura, que se posicionou contra um crime que causa "sofrimento e destruição de vidas e famílias", avançou com uma proposta que propõe uma pena de prisão de um a cinco anos ou o pagamento de uma multa, com a possibilidade de agravantes. A não distinção entre o "estado de relacionamento" ou de "não relacionamento" para a punição do crime é outro dos pontos pelos quais pugna.
Esquerda: estatuto da mulher no cerne da questão
Do PAN, "a responsabilização das vítimas em vez da culpabilização dos culpados" é o estado atual deste problema em Portugal, cunhado pelo "olhar misógino para a mulher". A criação do crime de divulgação não consentida de conteúdo íntimo ou de cariz sexual, através da alteração do Código Penal, com pena extensível até dois anos são as linhas base da proposta apresentada pelo partido.
As consequências particulares que estes atos, por sinal " mais novos e com contornos mais graves", têm para as mulheres ocuparam também grande parte do discurso de Joana Mortágua, do BE. "É um crime contra a liberdade sexual" e que "que tem de ser tipificado", afirmou na apresentação do projeto-lei que se desdobra em duas vertentes: a punição para quem filma sem consentimento e a punição para quem divulga da mesma forma. O projeto do BE prevê a criação do crime de pornografia não consentida, a punir com um ano de prisão.
Os únicos partidos a não apresentar projetos - PSD, Iniciativa Liberal (IL) e PCP - mostraram-se dispostos a discutir todas as propostas na especialidade, com especial destaque para a posição assumida pelo PCP, que entende que "a justiça não pode ser feita à margem da vítima", numa clara tomada de posição contra o estabelecimento deste ato como um crime público.