
Os juízes do Palácio Ratton dizem que o princípio de igualdade não está garantido
Foto: Tiago Petinga/Lusa
O Tribunal Constitucional (TC) chumbou a lei da nacionalidade, considerando que há quatro normas inconstitucionais. Em causa está um pedido de fiscalização preventiva do PS relativo a uma alteração da lei da nacionalidade e outro que se refere a uma norma acessória inscrita no Código Penal sobre perda de nacionalidade para quem tenha sido condenado em tribunal.
O TC atestou a inconstitucionalidade de quatro normas da nova lei da nacionalidade, três por unanimidade. A primeira refere-se ao impedimento de obtenção de cidadania para quem tenha sido condenado por um crime com pena de dois ou mais anos de prisão. "Estão em causa uma restrição desproporcional do direito fundamental de acesso à cidadania e a violação também da norma constitucional que estatui que nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos", referiu José João Abrantes, presidente do Tribunal Constitucional.
A segunda norma rejeitada estabelece que a consolidação da nacionalidade não "opera" em situações de "manifesta fraude", mas juízes consideraram não ser possível determinar esse conceito. Quanto à terceira norma, onde se lê que os pedidos dependem da data da autorização de residência e não do seu pedido, o TC atestou que está a ser violado o "pedido de proteção de confiança", defraudando expectativas legítimas. Por fim, a quarta norma rejeitada é a que possibilita o cancelamento da nacionalidade por comportamentos que rejeitem a adesão à comunidade nacional e os seus símbolos. A "inexistência de indicação" destes comportamentos levou à declaração da sua inconstitucionalidade.
Quanto às normas do decreto que cria a perda de nacionalidade como pena acessória, o TC decidiu, por unanimidade, que esta viola o "princípio da igualdade" ao diferenciar portugueses originários e naturalizados e os que têm nacionalidade há menos ou mais de dez anos.
Os diplomas regressam agora ao Parlamento, mas a maioria com que foram aprovados, superior a dois terços dos deputados, permite a sua eventual confirmação, mesmo após as inconstitucionalidades declaradas pelo TC.
Apertar os critérios de obtenção de nacionalidade
O Parlamento aprovou a lei da nacionalidade em votação final global em 28 de outubro, com 157 votos a favor, de PSD, Chega, IL, CDS-PP e JPP, e 64 votos contra, de PS, Livre, PCP, BE e PAN. Depois, o grupo parlamentar do PS apresentou um pedido de fiscalização preventiva das duas leis da perda e obtenção da nacionalidade, junto do Tribunal Constitucional.
O pedido dos socialistas visa as alterações à lei da nacionalidade e ao Código Penal para criar uma sanção acessória de perda de nacionalidade para naturalizados que cometam crimes graves com penas superiores a quatro anos. Na prática, as alterações apertam os critérios para os requerentes da nacionalidade portuguesa. O prazo para os estrangeiros pedirem a cidadania aumentam de cinco para dez anos e para sete se forem de origem dos países de língua oficial portuguesa e para cidadãos da União Europeia.
Esta é a segunda vez no espaço de quatro meses que o Tribunal Constitucional é convocado a pronunciar-se sobre leis que envolvem cidadãos naturais de outros países. Em agosto, a propósito da chamada Lei dos Estrangeiros, o Tribunal considerou que são cinco as normas inconstitucionais que constavam da proposta do PSD e do Chega, referentes à limitação do reagrupamento familiar a cidadãos que tenham entrado de forma legal em Portugal ou então que o requerente tivesse pelo menos dois anos de situação regularizada no país.
Foi ainda declarada inconstitucional a exigência de que, no reagrupamento, o requerente e os respetivos familiares devem cumprir medidas de integração, designadamente relativas à aprendizagem da língua portuguesa e dos princípios e valores constitucionais portugueses, bem como da frequência do ensino obrigatório no caso de menores. E ficou decidida a inconstitucionalidade do alargamento do prazo de decisão da Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA), que passava de dois meses para nove meses, segundo a proposta do Chega e do PSD. A decisão levou Marcelo Rebelo de Sousa a vetar lei, devolvendo o diploma ao Parlamento.

