Registos em plataformas para voluntários disparam com emergência sanitária. Jovens entre os que mais se disponibilizam para ajudar.
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Numa balança cujo (des)equilíbrio cada um toma por si, a pandemia trouxe também consigo o melhor do ser humano. A solidariedade. Dos movimentos de voluntariado informais, tão expressivos nas redes de vizinhança criadas. Mas também no voluntariado formal. Com a procura a aumentar nas plataformas de registo de voluntários. Nomeadamente para dar apoio a doentes covid.
Não há dados nacionais: há milhares de organizações e o número apontado pelas estatísticas oficiais de 695 mil voluntários no nosso país está subestimado. Mas há projetos que nasceram com - e para a pandemia - e que medem o pulso a este movimento.
inscritos triplicaram
É o caso da campanha "Cuida de Todos", lançada há um ano com o propósito de angariar voluntários para apoio a idosos em estruturas residenciais. A 19 de abril passado, de acordo com os dados fornecidos ao JN pela CASES (Cooperativa António Sérgio para a Economia Social), contava com 3804 voluntários, 30% dos quais na faixa etária 25-34 anos.
Já a Plataforma Portugal Voluntário, elo de ligação entre quem quer desenvolver ações de voluntariado e quem as promove, viu o número de inscritos triplicar num ano. Se em fevereiro de 2020 contava com 1174 voluntários, presentemente são 3727. Com as gerações mais novas a darem os primeiros passos: 30% dos inscritos têm entre 15 e 24 anos. Sendo que, sublinha a coordenadora do departamento de voluntariado da CASES, 36% ofereceram-se para trabalhar em contexto covid-19.
Segundo Paula Correia, "identificam-se como meses de maior registo os de abril, dezembro, maio e junho de 2020", voltando a registar-se um aumento em janeiro passado, "em acompanhamento do recrudescimento dos casos de covid em Portugal".
Se juntarmos ainda as candidaturas espontâneas de pessoas que querem fazer voluntariado sem inscrição em plataformas, num total de 356, em abril, só as duas iniciativas referidas contavam com 7887 voluntários.
Num perfil maioritariamente feminino (70%), com disponibilidade para ações, sobretudo, em Lisboa (41%) e no Porto (21%). "Com as mais variadas formações e profissões: de administradores de empresas a desempregados, arquitetos, atores, jornalistas, cabeleireiros, médicos", precisa a responsável da CASES.
O papel das escolas
Acresce o voluntariado informal. Incomensurável. Alavancado pelos "jovens" e com "as escolas a desempenharem um papel muito importante", diz, ao JN, o presidente da Confederação Portuguesa de Voluntariado. "Há coisas extraordinárias a serem feitas nas escolas, à custa das horas disponíveis de alunos e professores, em ações voluntárias de abertura à comunidade", frisa Eugénio Fonseca.
Defendendo uma alteração à lei do voluntariado (ler ao lado), o antigo presidente da Cáritas entende ser necessário enquadrar o voluntariado informal. Não no sentido da sua integração, mas de um "maior acompanhamento e capacitação". Quanto ao momento presente, entende que "quanto mais se fala da causa, mais as pessoas se motivam".
TESTEMUNHO
Isto une as pessoas e faz de nós melhores seres humanos
Margarida Rodrigues soube que centro de saúde precisava de pessoas para ajudar na vacinação e foi oferecer-se.
Margarida Rodrigues tem 18 anos e é estudante do primeiro ano do curso de Educação Social, em Viseu. Decidiu fazer voluntariado nesta fase de pandemia no centro de saúde do seu concelho, São João da Pesqueira, no apoio à vacinação.
A jovem sempre teve vontade de ajudar. "Gosto do contacto com as pessoas", diz. A primeira vez que fez voluntariado foi há cerca de dois anos, quando participou na recolha de alimentos e bens essenciais para a loja social do concelho. Desta vez decidiu ajudar de forma mais "próxima". "Soube que estavam a precisar de pessoas no centro de saúde durante o processo de vacinação e decidi ajudar", conta ao JN.
Sem receio, a voluntária tomou "todas as precauções" para sua segurança e de quem a rodeava. "Ajudei no que pude".
"As pessoas agora, em tempo de covid, não são tão pacientes e toda a ajuda é bem vinda", explica a voluntária, que tem pena de não ter mais tempo livre para dedicar ao voluntariado por estar a estudar longe de casa. "A vacinação tinha sido agendada para um fim de semana em que eu vinha a casa e aproveitei para ir ajudar", explica.
Margarida ficou com a função de receber os utentes e encaminhá-los para a fase seguinte: o preenchimento de um questionário. "Ainda há muitas dúvidas e os profissionais de saúde não conseguem chegar a todos", conta.
A voluntária gostou tanto da experiência que a pretende repetir. "As coisas agora estão mais calmas, mas assim que precisarem de mim estarei pronta". A estudante admite que, para o seu percurso académico, também é importante participar em ações de voluntariado. Mas "era o mesmo que não fosse. Ia ajudar sempre, porque me sinto feliz", explica.
Na escola "aprendemos a teoria", mas ao fazer voluntariado adquirem-se competências "que de outra forma não teríamos". Margarida Rodrigues acredita que "o voluntariado une mais as pessoas e faz de nós melhores seres humanos".A jovem admite que "a sociedade de hoje em dia não é voluntária e as pessoas estão sempre à espera de alguma coisa em troca". Mas dá a dica : "não há melhor sensação do que chegar a casa e pensar: hoje ajudei alguém".