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A queda de Bashar al-Assad na Síria pode parecer, à primeira vista, um capítulo distante numa crise prolongada no Médio Oriente. A primeira e mais óbvia consequência é a intensificação dos fluxos migratórios. Com o vácuo de poder na Síria e a fragmentação das instituições locais, milhões de sírios que permaneciam em campos de refugiados na Turquia, Jordânia e Líbano, ou mesmo deslocados dentro do país, agora buscam alternativas para escapar do caos. O destino preferencial? Europa.
O colapso do regime também significa o ressurgimento de zonas de insegurança no Médio Oriente, o que pode reativar grupos extremistas que ainda encontram simpatizantes na Europa. Apesar de a ameaça do Estado Islâmico ter sido reduzida nos últimos anos, a ausência de uma autoridade central na Síria cria as condições perfeitas para que células adormecidas voltem à ação. Enquanto isso, dentro da Europa, a polarização política intensifica os riscos. A narrativa anti-imigrante alimentada por partidos de extrema-direita encontra combustível em cada novo ataque ou em qualquer imagem de multidões desesperadas nas fronteiras.
Não se trata apenas de terrorismo, mas da forma como o medo é instrumentalizado para corroer democracias e enfraquecer a confiança nas instituições. É uma espécie de diplomacia da desordem. A queda de Assad enfraquece o Irão e o Hezbollah, mas fortalece a influência da Turquia e de grupos não-estatais, como o Hayat Tahrir al-Sham. A instabilidade na região aumenta a pressão por uma política externa europeia mais coesa, algo que o bloco historicamente tem dificuldade de oferecer.
Mas desta vez, depois de todas as promessas protecionistas de Trump, não virá amigo americano em seu auxílio. A crise síria é mais uma prova da fragilidade do sistema internacional contemporâneo. E se a queda de Assad encerra um regime brutal, ela também inaugura uma nova fase de incerteza. A Europa, mais do que nunca, precisa de decidir se enfrentará essas ondas de frente ou continuará à deriva, tentando adiar o inevitável.