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Os insultos pessoais e torpes que se ouviram no Parlamento nos últimos dias são demasiado graves para passarem inconsequentes. Se o regulamento é brando - e desajustado perante um hemiciclo habitado por deputados a quem falta a mais elementar urbanidade -, está na hora de o mudar. E de José Pedro Aguiar-Branco reavaliar a sua postura. Insistir que devem ser os portugueses, através do voto expresso de quatro em quatro anos, a sancionar os comportamentos desadequados dos deputados é uma incompreensível atitude de desresponsabilização por parte do presidente da Assembleia da República e segunda figura do Estado.
O Parlamento sempre foi palco de acesas batalhas ideológicas. Não é novidade. O que mudou foi a natureza dos ataques. O exemplo mais recente foi a crítica de Diva Ribeiro (Chega) a Ana Sofia Antunes (PS) por só intervir em “assuntos que envolvem, infelizmente, deficiência”, atacando a socialista pelo facto de ser invisual. O que se passou a partir daí - com apartes como “és uma aberração” e “isto não é uma esquina”, “pareces morta” e “és uma drogada” dirigidos a várias deputadas, feitos com microfone fechados mas audíveis em todas as bancadas - foi degradante, mas não inédito. Nos últimos tempos são frequentes os insultos machistas, os comentários homofóbicos, as ofensas pessoais e gratuitas, as interrupções sistemáticas, a intimidação, numa clara estratégia de alienação e descrédito das instituições democráticas que move a extrema direita.
Se quase todos concordam que os limites do debate parlamentar têm sido rechaçados, falta consenso quanto ao que fazer. O PS quer mudar o código de conduta dos deputados. O PSD defende que não se pode punir a falta de educação, alinhando na defesa de Aguiar-Branco, para quem os deputados “não são polícias de uns e de outros”. O assunto é sensível, até porque a vitimização foi bem capitalizada pelo Chega quando na anterior legislatura Santos Silva adotou uma postura muito interventiva, mas é por demais evidente que o atual quadro é insustentável e que é preciso novos e eficazes mecanismos de regulação que travem os insultos à democracia.