Nas eleições legislativas, os eleitores escolhem os seus representantes na Assembleia da República, os deputados, aos quais é outorgado o poder de legislar em matérias constitucionalmente determinadas.
Corpo do artigo
Duzentos e trinta cidadãos ganham, assim, competência legislativa exclusiva em áreas decisivas para o país. Daqui se infere que da qualidade individual dos deputados depende, em boa medida, o vigor da nossa vida democrática.
Importa, por isso, que nas próximas eleições legislativas os eleitores ponderem não só sobre os programas eleitorais de cada partido, mas também sobre a qualidade dos candidatos a deputados. Ou seja, sobre a sua preparação e maturidade para o exercício do cargo. Isto porque, nas últimas legislaturas, fomos confrontados com iniciativas legislativas dos deputados que não abonam a favor de uma democracia consolidada como a nossa.
A falta de qualidade legislativa tem sido evidente em várias situações, particularmente quando estão em causa matérias muito delicadas ou de maior especialização. A título de exemplo, lembro a recente lei da eutanásia, vetada pelo presidente da República por manifestas imprecisões, ou a lei do teletrabalho, considerada impraticável por muitos especialistas.
Causam apreensão as incongruências, omissões, inconsistências e iniquidades que a generalidade dos cidadãos, mesmo não sendo juristas, deteta em alguma da legislação emanada do Parlamento ou do Governo. Que não haja dúvidas: a qualidade da democracia é erodida com leis pouco pensadas, mal concebidas e sem fundamentos sólidos.
À data em que escrevo, o Governo prepara-se para avançar com uma alteração legislativa que pode vir a enfermar dos mesmos problemas. Trata-se de permitir aos confinados irem votar, estejam em isolamento profilático ou até infetados. Parece-me que, se for mal feita, a revisão circunstancial das regras de isolamento abre um precedente perigoso e choca com o direito à segurança sanitária dos restantes eleitores - os quais podem, em função disso, decidir não ir votar, pervertendo o fundamento da medida.
E assim se corrói, um pouco mais, a qualidade da nossa democracia...
*Reitor da Universidade do Porto