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Os efeitos da mudança dos hábitos de leitura já impulsionam teses de doutoramento, embora seja mais avisado esperar alguns anos para extrair conclusões. Num tempo em que abunda a opinião, amplificada e estupidificada, verdades absolutas facilmente serão desmentidas no futuro. Mas não devemos ficar parados perante esta grande teoria da substituição das fontes do saber. O livro ainda é o que era, o ato de googlar é um perigoso catalisador de preguiça, não podemos aceitar e enquadrar tudo isto numa conjuntura de evolução, porque a resposta pronta e direta priva-nos de perceber como e porquê.
À entrada para o fim de semana, uma boa notícia dava conta de que a venda de livros aumentou 7%. Um sinal de esperança que passa a preocupação se nos dermos ao trabalho de percorrer as listas dos mais vendidos. Das mil e uma receitas para air fryer às técnicas infalíveis para o enriquecimento lícito, há para todos os gostos. Se estão no mercado é porque alguém os compra, o top de vendas confirma-o. Como cozinhar é uma arte que precisa de treino, porções e temperos certos, admito que os descendentes do “Livro de Pantagruel” sejam uma ótima ajuda na confeção de prodigiosas iguarias, mas tenho muitas dúvidas sobre a eficácia dos exemplares que se propõem ensinar-nos a enriquecer. Talvez os autores das obras fiquem bem na vida. Talvez.
A única certeza que tenho é que estaremos sempre mais ricos se adquirirmos conhecimento e educarmos o pensamento através da leitura de textos e obras de grandes autores. Temos obrigação de explicar isso aos nossos jovens. Que é tão importante ter o telemóvel no bolso como o livro na mochila. Desde cedo. Se possível, antes de serem confrontados com a imposição nos planos curriculares desta ou daquela obra, tantas vezes substituídas por resumos, que há décadas já funcionavam como uma espécie de Google antes de haver Google. Como nos livros sobre enriquecimento, também os autores destes resumos ficavam uns trocos mais ricos. E os compradores mais pobres. Intelectualmente, sobretudo.