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Cinco dos principais grupos de laboratórios a operar em Portugal foram condenados pela Autoridade da Concorrência ao pagamento de coimas no valor global de 48,6 milhões de euros. Confirmando-se a argumentação desta entidade, ninguém deixará de ficar indignado ao ter conhecimento que as empresas não só concertaram preços, como o fizeram no período agudo da pandemia, ameaçando o Estado de boicotar o fornecimento de testes covid se acontecesse alguma redução dos preços convencionados. Na mesma altura, milhares de trabalhadores enfrentavam a dura realidade do lay-off, outros acabaram no desemprego, empresários viram-se obrigados a encerrar negócios, tanta gente afetada e a trabalhar o dobro sem olhar a dinheiro, como médicos, enfermeiros, bombeiros. Quando somos confrontados com uma coima desta dimensão, pensamos que a justiça tarda, mas aparece. O problema é que temos memória. A minha ofereceu-me um trabalho publicado pelo JN há quatro anos. Procurei e encontrei: de 2004 a 2020, apenas 2,7% das multas com origem na Autoridade da Concorrência tinham sido pagas. Os outros milhões andavam de prateleira em prateleira, congelados sob a forma de recursos nos tribunais, porque quando a conversa é sobre grandes laboratórios, gasolineiras gigantes ou hipermercados, a dimensão interessa, desde logo pela facilidade de acesso aos maiores escritórios de advogados. Quando se trata do contribuinte comum, é diferente. Pagar primeiro e reclamar depois. Ou sem direito a reclamação, como nos casos das centenas de euros liquidados em coimas por causa da falta de pagamento de umas poucas dezenas de cêntimos em SCUT. As regras mudaram há dias, mas o jogo nunca será repetido.