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A ideia de descrédito é tão penalizadora num projeto como a falta de dinheiro para o concretizar, causando constrangimentos ainda mais significativos do que os financeiros. Quem teve oportunidade de ver a edição de ontem do “Jornal de Notícias” ficou a saber, ou confirmou, que os portugueses estão insatisfeitos com a Justiça, preocupação partilhada por 80% dos cidadãos. Bem pode a Procuradora-Geral da República em fim de ciclo, Lucília Gago, desdobrar-se em explicações tardias, esse tempo passou, também por responsabilidade própria, mas há mais agentes a fazer o papel de catalisadores da fórmula do descrédito. Desde logo os políticos, que nos últimos meses tanto se queixam - e muitas vezes com razão -, porque não conseguiram desenvolver um pacto de regime que permita meter a Justiça nos eixos. Um “disclamer” para as almas mais desassossegadas: em democracia, os políticos não têm de controlar a ação do Ministério Público (MP), não é disso que se trata. Meter a Justiça nos eixos é dotá-la de condições para poder investigar, para ser célere, para chegar a todos. A indignação devido à violação do segredo de justiça e às revelações em cima de acontecimentos relevantes na vida pública dos visados, que conduzem a condenações sumárias, tem razão de ser, mas encerra o lado tristemente irónico de as vítimas serem, simultaneamente, responsáveis pela falta de meios com que se debate a Justiça em Portugal e que sucessivos governos não conseguiram resolver. A discussão devia acontecer no sentido de encontrar um pacto de regime, suportado pelos partidos do arco da governação, com meios e estratégia que devolvam a confiança, caso contrário, tudo continuará igual.