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Numa crónica recente no jornal “El País”, o escritor Enrique Vila-Matas considerava que a atual efervescência das redes sociais digitais não constitui mais do que “a forma mais avançada de demonstrar aquilo que a existência sempre foi: uma rede de intercâmbio e de transmissão de mensagens”. Chegadas às nossas vidas, porém, com o rosto sempre atraente da novidade, as “redes” foram vistas, no início, como uma ferramenta capaz de promover a informação, a troca de conhecimento, a participação cidadã, a discussão de ideias e, consequentemente, a coesão das nossas sociedades.
Todavia, e como Vila-Matas também refere naquele texto, a versão digital dos seres humanos que frequentam e usam as redes sociais é paradoxalmente pior e “mais desonesta” do que a sua face real. Assim, e em vez de usarem aquelas redes para fins benéficos e úteis, muitos utilizadores têm preferido recorrer a estas ferramentas para, tantas vezes ocultos pelo anonimato, promoverem a desinformação, o ódio e a desagregação social.
Abundam nas redes, deste modo, a mentira, a manipulação e as notícias falsas, as quais não parecem ter outros objetivos que não a propagação da confusão e da desconfiança, e a destruição dos valores éticos que partilhamos enquanto comunidade. Este expediente não constitui também uma novidade: Joseph Goebbels, o ministro da propaganda da Alemanha nazi, fixou para a posteridade a frase segundo a qual uma mentira mil vezes repetida acaba por ser confundida com a verdade.
Parecendo evidente, para qualquer pessoa dotada de honestidade intelectual e bom senso, que a denúncia (ou a condenação em tribunal) das notícias falsas, da manipulação e da pura mentira jamais conseguem reparar os danos causados aos indivíduos visados e à comunidade, é, ainda assim, necessário que não desistamos de lutar pela verdade e pela lisura. Mas existem riscos óbvios: torcendo a moral subjacente à arquetípica história de Esopo, é possível que, um dia destes, também já ninguém se incomode com o lobo que está a atacar o rebanho.