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Nem sempre o Mundo pula e avança. A história também nos reserva recuos. Quando estes retrocessos se situam no domínio dos direitos fundamentais, devemos estar atentos, preocupados e encontrar explicações e defesas que nos permitam travar injustiças. Numa era de crescimento desenfreado em que nada nem ninguém admite andar para trás, é difícil encaixar sem ficarmos atónitos e indignados que, depois de nove anos consecutivos de aproximação, o nível salarial das mulheres, quando comparado com o dos homens, tenha conhecido um retrocesso em Portugal. Saindo da esfera do nosso país - embora também se coloque por cá -, na edição do último domingo, a “Notícias Magazine” mostrava-nos como está em risco, em vários pontos do planeta, o direito das mulheres ao aborto. São dois exemplos avulsos, aos quais seria possível acrescentar muitos outros, que nos indicam uma indesmentível tendência associada ao crescimento de uma certa arquitetura de família tradicional, potenciada, sobretudo, por ideais conotados com movimentos radicais de direita.
Como os filhos, as conquistas de direitos fundamentais por parte das mulheres - viajar livremente, ter uma carreira ou votar -, foram muitas vezes arrancadas a ferros. A sociedade, na sua imensa maioria moderada e sensata, tem obrigação de não adormecer à sombra de situações que vemos como adquiridas mas que, quase sem darmos conta, começam a ser colocadas em causa. Quando analisamos os estudos de opinião mais recentes sobre quem vota nos partidos radicais de direita, percebemos que a percentagem de jovens do sexo masculino é muito superior ao feminino. Está também a ser estudada e levada a sério a indicação de que os rapazes se sentem ameaçados pela prevalência crescente das raparigas na sociedade, um receio que não faz ponta de sentido, até porque durante séculos, numa dinâmica invertida, o grosso da comunidade masculina nunca se preocupou com o assunto: é só o Mundo a pular e a avançar, o contrário, sim, seria preocupante.