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Sem ser entusiasmante em relação a Kamala Harris, o debate entre candidatos à presidência dos Estados Unidos serviu para a coroação de Donald Trump como perfeito pateta. A rábula dos imigrantes que comem gatinhos de estimação - uma mentira estafada que circula de país em país, com passagem por Portugal, impulsionada pelos racistas que pastam nas redes sociais - foi a cereja no topo do tolo. Num outro tempo, disparates tão refinados serviriam para enterrar de vez as aspirações dos conservadores, mas a história recente diz-nos que não é bem assim. Mesmo que a contagem da CNN garanta que Donald Trump mentiu 30 vezes, há de haver sempre um número muito significativo de norte-americanos a acreditar nele. E a história repete-se noutras latitudes, onde também o populismo e o racismo crescem e alcançam o poder com recurso aos mesmos expedientes. O fenómeno é global.
É importante perceber como a sociedade chegou a este ponto de adormecimento que conduz a um certo compromisso com a mentira. Aceitamos que os políticos usem e abusem, sobretudo em campanha eleitoral, de inverdades e promessas que nunca conseguirão cumprir. A propaganda é tolerada de forma consciente. O problema é que a mentira tem um lado obscuro e pandémico, que se tornou num grande negócio. Quem nunca foi enganado por uma publicação numa rede social? A forma de comunicar está em permanente evolução e, neste caso, o crime compensa, porque as teorias falsas e mirabolantes destinadas a modelar a opinião pública continuam a infetar eleições. Nessa perspetiva, o debate foi profilático e clarificador, porque Trump mordeu todos os iscos lançados por Harris, acabando despido de sensatez e exposto ao ridículo.