À medida que aumenta a violência; que assistimos à destruição de escolas, hospitais, zonas residenciais; à medida que testemunhamos a morte dos jovens soldados (não são menos humanos que os outros, incluindo os russos que Putin usa como carne para canhão); que nos horrorizamos com a morte de crianças; assim aumenta o nosso desejo de vingança; assim a emoção se vai sobrepondo à razão. É natural. Mas pode ser perigoso.
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Os ucranianos exigem que se cortem as asas aos anjos da morte. É compreensível. Os caças, os helicópteros, os mísseis de longo alcance são um dos instrumentos da morte. Mas fechar os céus significaria que os países europeus e os americanos teriam de abater as aeronaves russas. Significaria a guerra total, quando do outro lado está uma potência nuclear e um grupo de sádicos. Não é cobardia, como argumenta quem já devia ter idade para ter juízo. É instinto de sobrevivência. É a razão a sobrepor-se à emoção. Como é preciso que aconteça sempre entre quem tem a responsabilidade de decidir o destino dos povos.
Há depois os que pedem um embargo total ao petróleo e ao gás russo. Já não apenas os ucranianos, mas muitos, cada vez mais, por essa Europa fora (os americanos, que já o decidiram fazer, não contam, têm capacidade de produção e reservas que garantem a autossuficiência). Mas, mais uma vez, é preciso usar a razão, em vez da emoção. É certo que, todos os dias, os países europeus entregam à Rússia 261 milhões de euros pelo seu petróleo. E cerca de metade deste valor pelo gás natural. Uma fortuna colossal só por si quase suficiente para pagar a guerra de Putin.
Os alemães, no entanto, travaram os ímpetos. Sabem que fechar a torneira do petróleo e do gás arrasta uma fatura brutal: milhares de empresas que terão de fechar; milhões de trabalhadores com o emprego em risco; preços incomportáveis na hora de encher o depósito do carro ou aquecer a casa. Já não se trata da sobrevivência da espécie humana e, portanto, muitos entenderão que é um preço aceitável. Mas, se for o caso, que seja depois de feitas as contas e explicados os custos a quem terá de os pagar. Não são seguramente os oligarcas do Ocidente. Estamos perante um dilema moral. Ninguém julgue que escapa dele só porque atira uma bravata numa televisão.
*Diretor-adjunto