"Fundação é uma palavra maldita", desabafa o presidente da Câmara da Mealhada. Por causa do beco sem saída burocrático que impede a recuperação da Mata Nacional do Buçaco, devastada pelo temporal.
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Muito feia foi a coisa, a 19 de janeiro. Entre árvores tombadas ou quebradas, contam-se mais de cinco mil, algumas delas destruindo património arquitetónico, como ermidas ou várias estações de uma Via Sacra única no país. E dói ver como aquela mata única e densa, pejada de espécies oriundas de todo o Mundo - como o cedro mexicano que os monges espanhóis para ali levaram e passou a ser "cedro do Buçaco" -, se assemelha aqui e ali a galinha que fugiu quando a queriam depenar.
Não é o fim do mundo, apenas a necessidade de reacertar agulhas e recentrar o esforço na reconstrução. Porém, isso custa dinheiro. O autarca, Carlos Cabral, fala num prejuízo que ronda os seis milhões de euros, mas, sobretudo, sublinha as bizarrias que, num contexto em que o Estado não gasta ali um cêntimo, impedem o município de apoiar a entidade gestora da mata.
Recuemos ao princípio deste tempo, isto é, à constituição da Fundação Mata do Buçaco, forma encontrada para pôr ordem na gestão da mata, desacertada quase desde que a mesma passou para a tutela pública, com a extinção das ordens religiosas, em 1834. Bom, não precisamos de recuar tanto. Antes de 2009, a gestão da mata passava pela Direção-Geral das Florestas, a par de meia dúzia de outras direções gerais. "Ninguém se entendia", diz Cabral, notando que o esforço para uma gestão integrada da mata desde logo deu frutos, até que o Governo interveio, alegadamente, de forma desajustada.
Tudo começou com o censo às fundações, processo que o presidente da Câmara classifica de irregular. "O método de classificação é absurdo. Foram avaliados três anos, num dos quais a fundação não existia, e, com isso, foi mal avaliada, não chegando a ter 50 numa escala de zero a cem", salienta Carlos Cabral.
Não ficamos por aí. Uma resolução do Conselho de Ministros, de 8 de março último, impede todas as entidades públicas, Câmara incluída, de apoiar a fundação. Esse apoio (ver caixa) até pesava pouco no orçamento municipal, enquanto "a Administração Central dava zero e cortou 30% a esses zero".
Uma réstia de esperança foi dada pelo secretário de Estado das Florestas e do Desenvolvimento Rural, que terá garantido à Câmara da Mealhada, por ter um entendimento diferente da limitação ditada pela resolução de 8 de janeiro, que poderá financiar a fundação. Para tal, iria obter, até ao fim de abril, um parecer do Ministério das Finanças. Chegou maio. Parecer, nem vê-lo.