Desde as 10 horas deste sábado que as portas da igreja de Nossa Senhora da Lapa, no Porto, estão abertas a todos os que quiserem ver o coração de D. Pedro IV. O coração, doado à cidade há cerca de 200 anos, estará novamente em exposição este domingo, até às 16 horas, antes de viajar até ao Brasil.
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A longa fila à porta da Irmandade da Lapa é prova viva da curiosidade do Porto, transversal a todas as gerações, em ver com os próprios olhos o coração de D. Pedro IV, doado pelo monarca à cidade, como agradecimento pelo apoio pela luta liberal. Até às 15 horas deste sábado, cerca de 1700 pessoas já tinham visitado a peça, em exposição no Salão Nobre da Irmandade da Lapa. As portas abriram às dez, mas muitos fizeram questão de garantir um lugar na fila mais cedo.
Durante a manhã, a exposição contou com a presença do treinador de futebol André Villas-Boas, que considerou uma "oportunidade única", em particular, para os portuenses, estar perante "tamanha dádiva de D. Pedro IV à cidade". "É uma oportunidade única e histórica", disse à Lusa.
Entusiasta de história, Madalena Nunes, de 19 anos, confessa que há muito queria ver o coração do rei. "Só percebi que estava guardado uma vez em que vim à igreja da Lapa. Quando soube desta oportunidade achei que não a devia perder", confessa a gondomarense, que ficou "uns dez minutos" à espera, na fila, para entrar com a família. Sobre a peça em si, diz ter ficado surpreendida com a dimensão: "Achei que o coração era mais pequeno".
Na fila, igualmente curioso para ver o órgão pela primeira vez, estava Hugo Canossa, de 45 anos. Sobre a viagem da peça ao Brasil, que se realizará na noite de domingo, confessa ter "bastantes reservas" no que toca à "segurança da operação, a própria manutenção do coração enquanto lá estiver e principalmente da devolução". Recorde-se que o regresso da peça está marcado para o próximo dia 9 de setembro, seguindo-se uma nova exposição no Porto, nos dias 10 e 11 de setembro.
"Tenho falado com alguns conhecidos brasileiros que dizem não perceber como é que nós, portuenses, estamos a permitir que o coração vá para lá. E eles sabem melhor do que eu quem lá está a tomar conta da peça", clarifica o professor.
"Como portuense, preocupa-me", confessa Hugo Canossa.
Kit de emergência preparado para a viagem
A equipa da Polícia Municipal do Porto que está a garantir a segurança da relíquia na igreja de Nossa Senhora da Lapa, conta com o próprio comandante, António Leitão da Silva. Além da operação de segurança montada na sala onde permanecerá exposto o coração este sábado e domingo, o comandante destaca "aquilo que as escolas médicas e o Instituto de Medicina Legal fizeram, à priori desta exposição: garantirem que o coração podia viajar para o outro lado do Atlântico". "Essa sim é que é a grande operação de segurança propriamente dita", nota Leitão da Silva, que vai acompanhar a viagem da peça até ao Brasil.
"Amanhã, durante a madrugada, partiremos em direção a Brasília onde será apresentado o coração de D. Pedro. Como é do conhecimento público, a única imposição técnica foi a de o coração viajar em ambiente pressurizado. E as autoridades brasileiras têm tratado este processo de uma forma altamente profissional e muito dedicada. Aliás, vem uma aeronave da Força Aérea Brasileira, propositadamente ao Porto, buscar o coração", salientou o comandante da Polícia Municipal.
Caso surja uma eventual "situação limite", há um kit de emergência preparado: "É claro que a responsabilidade da segurança da peça em território brasileiro é das autoridades brasileiras, mas estão a par de todas as limitações e, em certa medida, do que fazer numa situação que, de certeza, não vai acontecer".
"Este kit de emergência duplica tudo o que veem aqui: o líquido de conservação e o recipiente para conservar a peça anatómica", clarificou Leitão da Silva.
O horário da exposição de domingo será mais curto uma vez que "há um conjunto de procedimentos técnicos no que diz respeito à acomodação e transporte do coração ao Aeroporto Francisco Sá Carneiro, que tem de ser feito com muita calma e em segurança".
Pelas 16 horas deste domingo, hora de encerramento da exposição, o presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, e o embaixador da República Federal do Brasil em Lisboa, Raimundo Carreiro Silva, vão assinar o protocolo que define as condições da transladação.
"Um coração daquele tamanho só de uma pessoa muito boa"
"Sei que D. Pedro veio do Brasil para Portugal e que foi muito bem acolhido aqui no Porto. Quis deixar ficar o coração cá. Adoro história e por essa razão, mal vi no Facebook, quis vir visitar. Uma cunhada minha veio de manhã e mandou-me uma fotografia. Disse logo que vinha a correr e pus-me aqui num instante, de metro, desde a Senhora da Hora", conta Cidália Vedor, de 61 anos, acompanhada pelo marido, Carlos Vedor, de 62 anos.
Na fila, à espera, estiveram cinco minutos. "Foi a primeira vez que vi. É formidável. Só gostava de saber se ele é mesmo daquele tamanho ou se está inchado por estar em líquido", questiona Cidália. Carlos acha que é do líquido.
"Um coração daquele tamanho só de uma pessoa muito boa", brinca Cidália. "Mas está tudo muito bonito. Gostei muito. Para quem gosta de história é muito bom", conclui.