Movimento já chegou a mais de 500 pessoas e tem parcerias com instituições e juntas de freguesia.
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Aconchegadas na poltrona vermelha, Maria José e Nini contemplam o rio Douro. A viver no Bonfim desde sempre, mãe e filha não se lembram da última vez que desceram até à Ribeira. "Vai para dois anos que não venho cá", recorda Maria José, 87 anos, cuidadora desde sempre de Nini, uma menina especial cuja vida ficou marcada por uma meningite quando era criança. Agora, através do "Pedalar sem idade", saem de casa sem receios ou entraves
A ideia viajou de Copenhaga, na Dinamarca, em 2018 e fixou-se no Porto com a missão de passear idosos numa bicicleta elétrica concebida exclusivamente para o efeito. "Isto é maravilhoso. Como sou uma pessoa doente, com problemas cardíacos e dificuldades em me deslocar, é muito bom porque apanho ar e convivo com pessoas", desabafa Maria José. Emocionada, não se cansa de agradecer o "esforço" dos voluntários e até traz flores para Ana Paula, o terceiro elemento da equipa de passeio.
Sentada no selim, é ela que comanda os destinos da excursão. Abraçou o projeto há dois anos por causa da filha, com síndrome de Rett, e atualmente integra a equipa de 18 pilotos voluntários do "Pedalar sem idade". Um desafio que se traduziu numa "troca enriquecedora" de histórias e aprendizagens e que a faz voltar a casa com o sentido de dever cumprido. Sente-se útil. "Saber que faço bem e deixo alguém feliz enche-me a alma. Venho muito preenchida dos passeios", confessa.
Duas horas a passear
Além de proporcionarem uma atividade diferente, as viagens são uma oportunidade para descobrir locais e apreciar a cidade. O traçado irregular não é problema quando o passeio é feito sem pressas durante duas horas.
"Há zonas mais cicláveis do que outras, mas o património edificado é tão bonito que vale a pena o esforço. Basta irmos com calma e olharmos à volta", afirma Ana Paula.
Sílvia Freitas, responsável pelo "Pedalar sem idade" explica ao JN que o objetivo é "trazer benefícios na saúde mental e física das pessoas", e que tal só acontece quando a ação é regular e sempre com o mesmo piloto. O projeto trabalha com uma dezena de instituições e com as juntas de freguesia do Bonfim e de Paranhos, que sinalizam os idosos e os convidam a passear.
Dissipar o isolamento
Helena e Letícia fazem parte dos 50 utentes que usufruem do sofá com rodas todos os meses. Vivem sozinhas, uma ao lado da outra e fazem tudo juntas. Com a maioria das atividades vedada devido à pandemia, sentem-se seguras nestes passeios ao ar livre.
De máscara no rosto e com o separador acrílico para duplicar a proteção, apertam os cintos e seguem viagem do Parque da Cidade ao Castelo do Queijo. "É uma experiência muito simpática e faz bem à cabeça", afirma sorridente Letícia, 69 anos, com o telemóvel na mão para captar as melhores paisagens.
Pelos jardins do parque pincelado pelas cores de outono, Vítor vai animando as duas amigas. Amante de bicicletas, o experiente ciclista tirou a formação obrigatória de piloto no verão para ajudar um membro da família. "Pensei no meu sogro. Com o confinamento deixou de conduzir e ficava muito fechado em casa. Esta foi a possibilidade de o pôr a ver locais aos quais nunca mais iria na sua vida de 90 anos", confidencia.
Com a pandemia, a procura por parte das juntas de freguesia aumentou. Há duas bicicletas a servir "os grisalhos" da comunidade, mas o objetivo é adquirir mais um veículo para conseguir chegar a mais pontos da cidade. O combate à solidão e ao isolamento é a bandeira do "Pedalar sem Idade" que garante todas as condições para um passeio seguro. "Esta é a única atividade que se pode realizar no exterior em segurança",garante a responsável.