Refugiadas em Sabrosa: "Gostamos de estar em Portugal, mas a Ucrânia é a nossa terra"
Duas das refugiadas acolhidas em Sabrosa vão regressar com os filhos ao país em guerra nos primeiros dias de março.
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A caminho da aldeia de Souto Maior, em Sabrosa, Svitlana Kotenko confessa: "O que gosto menos em Portugal é das curvas". Na zona de Kharkiv, na Ucrânia, de onde fugiu há um ano devido à invasão russa, "quase tudo é plano". Ou seja, nada a ver com o Douro, região de montanha que a acolheu como refugiada de guerra, e onde às vezes há nevoeiro. "Nunca tinha visto nuvens junto à terra", sorri, maravilhada.
A ex-polícia Svitlana é uma das "33.900 mulheres" a que o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) atribuiu proteção temporária desde o início do conflito na Ucrânia. Somando "24.143 homens", o número de cidadãos ucranianos e de estrangeiros que residiam naquele país refugiados em Portugal ascende a "58.043".
De acordo com o SEF, os municípios com o maior número de proteções temporárias concedidas continuam a ser "Lisboa (12.385), Cascais (3.665), Porto (2.976), Sintra (1.955) e Albufeira (1.443)". Os menores representam "14.111 do total".
Svitlana Kotenko tem 34 anos, deixou o marido na Ucrânia, e veio para Sabrosa com o filho de seis anos, a mãe, a cunhada e duas sobrinhas. Integraram um grupo de 10 adultos e oito crianças acolhidas na antiga escola primária de Souto Maior que foi adaptada às novas funções. Três deles regressaram ao país de origem há pouco tempo.
O primeiro grupo chegou por iniciativa de munícipes que planearam retirar refugiados da fronteira da Polónia com a Ucrânia. Angariaram donativos de empresas e da comunidade local, e também com o apoio da Câmara de Sabrosa, foram em duas carrinhas de nove lugares buscar os primeiros 13 refugiados (oito adultos e cinco crianças). Os restantes chegaram por intermédio do Alto Comissariado para as Migrações.
Svitlana e Maryna Laktionova, de 36 anos, vão regressar a Kharkiv, cidade perto da fronteira com a Rússia e "onde a situação está mais calma", nos primeiros dias de março. Apesar de, tal como as restantes mulheres, trabalharem em serviços da Câmara de Sabrosa e de os filhos estarem bem integrados nas escolas locais, dizem que é hora de voltar.
"Gostamos de estar em Portugal, mas a Ucrânia é a nossa terra", suspiram, ambas, sem esconder que têm "saudades dos maridos", cuja saída do país não foi autorizada. E "as crianças precisam dos pais", apesar do "medo" de voltar a um país em guerra, onde "as bombas estão sempre a cair". "O mais importante é ter a família unida", sublinha Maryna.
"Gostaríamos muito que ficassem na nossa comunidade, pois estão perfeitamente integradas, mas a informação que temos é que todas querem regressar. Temos pena, mas não é a opção de vida delas", refere Martinho Gonçalves, vice-presidente da Câmara de Sabrosa.
Para já, o autarca pode contar com a permanência em Souto Maior de Halyna Ulchenko, 39 anos. Não vai sair de Portugal enquanto a guerra não acabar. Isto apesar de o filho de nove anos que trouxe com ela ter tido "dificuldades de adaptação" e já ter regressado com a avó à região de Dnipro, na Ucrânia. "O meu objetivo é que voltem para cá, pois não consigo estar descansada com eles lá".
Martinho Gonçalves explica que até os ucranianos começarem a receber o Rendimento Social de Inserção, "a autarquia suportou os custos com alimentação, produtos de higiene, transportes, cuidados de saúde, entre outros".
Svitlana trabalha no centro escolar de Sabrosa, onde o filho frequenta o primeiro ano. Maryna trabalha, juntamente com Halyna, no Arquivo Municipal, e tem o filho de nove anos a frequentar o terceiro ano.
Ivanna Rohashko, 26 anos, criou a Associação de Ucranianos de Vila Real, que tem apoiado os refugiados na adaptação. Refere que o trabalho tem sido "fantástico", sobretudo na ajuda a "ultrapassar a barreira da língua, que é um bocadinho complicada".
O curso de português que estas ucranianas frequentaram, ministrado através de um protocolo da Câmara com o Instituto de Emprego e Formação Profissional e com o Instituto da Segurança Social, ajudou a ultrapassar a barreira.
Ivanna, que já está há 13 anos em Portugal, percebe que as refugiadas queiram voltar já para a Ucrânia. Explica-se pelo facto de "não terem vindo por opção própria, mas pela necessidade de fugirem da guerra". E "por mais que Portugal seja fantástico, com bom clima, boa natureza e boas pessoas, este não é o país delas".