Os europeus consideram a família a principal prioridade, defendem a igualdade entre homens e mulheres nas tarefas domésticas e com os filhos, mas nem sempre o praticam, sobrecarregando as mães, principalmente as portuguesas.
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Com base em dados do European Social Survey, realizado em 26 países e conduzido em Portugal pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e pelo Instituto Superior das Ciências do Trabalho e Empresa (ISCTE), Anália Torres concluiu que "a família é a principal prioridade da vida dos indivíduos" em toda a Europa quando a questão é escolher entre áreas, como trabalho, amigos, política ou religião.
Em declarações à agência Lusa, a investigadora do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas (ISCSP) realçou que a família já não é encarada de uma forma "antiga, tradicional", mas sim como um agregado em que os pais devem centrar a sua atenção no bem-estar dos filhos, nomeadamente o emocional.
"A ideia que as pessoas têm de que agora não se valoriza a família é errada. Habitualmente diz-se é que a família, os amigos e o lazer são as coisas mais importantes na vida", frisou Anália Torres. E neste aspeto, "não há distinção entre países do sul e do norte da Europa", o que surpreendeu a investigadora.
Os europeus apontam também que os homens devem ter mais responsabilidades nas tarefas domésticas e no cuidado com os filhos, valor defendido tanto por homens como por mulheres, "embora um bocadinho mais pelas mulheres".
A especialista frisou, porém, que "o facto de se dizer que os homens devem atribuir a mesma responsabilidade não significa que depois, na prática, dediquem tanto tempo à família, aos trabalhos domésticos e aos cuidados com os filhos como as mulheres".
"Estamos muito longe de uma igualdade, na prática", na maior parte dos países, à exceção dos escandinavos, ou seja, no sul da Europa, e "em Portugal em particular", há um "sobre trabalho das mulheres porque acabam por trabalhar na área profissional quase tantas horas como os seus parceiros e acumular toda a parte das tarefas domésticas e dos cuidados com os filhos".
O stress associado a esta multiplicidade de tarefas "é grave, tem efeitos negativos, [ou seja], não é só uma situação de desigualdade, tem efeitos em todas as esferas da vida, nos planos emocionais, de bem-estar e até no plano da saúde", alertou Anália Torres.
No entanto, defendeu que se deve "valorizar o facto de já toda a gente dizer que isso é importante".
A investigadora referiu que, nos locais de trabalho, ainda há uma atitude diferente para homens e mulheres, no que respeita a família. "Se for uma mulher mãe, pensa-se logo que, apesar de trabalhar, deverá dar mais atenção à família, relativamente ao homem o implícito é o simétrico: tem família, mas a questão principal para ele, em termos de masculinidade adequada, é que se preocupe mais com o trabalho do que com os filhos", explicou.
As mulheres "têm receio de que se lhes diga, mesmo sendo trabalhadoras, que não são boas mães. É uma espécie de fantasma que paira sobre as suas cabeças, e, embora valorizem a sua atividade profissional, por vezes tentam não mostrar muito", acrescentou Anália Torres.
O trabalho de análise dos dados do European Social Survey "Perspetivas Igualitárias sobre Família na Europa: Evolução em Contexto de Crise" teve a colaboração de Bernardo Coelho e Diana Carvalho do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES).