O mandatário de um empresário que perdeu 21 milhões de euros depois de ter sido, alegadamente, ludibriado por um gestor do Banco Privée Espírito Santo, na Suíça, a investir em instrumentos financeiros de sociedades do Grupo Espírito Santo (GES) pediu, esta quinta-feira, que o bancário seja julgado por burla qualificada.
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O arguido tinha sido, no final do inquérito à queda do BES/GES, ilibado pelo Ministério Público, mas reentrou no processo depois de o queixoso ter requerido a abertura da instrução para contestar o arquivamento. Carlos Malveiro quereria apenas colocar o seu dinheiro em depósitos a prazo, menos rentáveis mas cobertos pelos Estados em caso de insolvências de instituições bancárias.
"Penso que é absolutamente claro que o senhor Carlos Malveiro foi enganado", frisou, no terceiro dia do debate instrutório do processo, em Lisboa, Ricardo Sá Fernandes, invocando diversos e-mails trocados entre o arguido e o queixoso em que este refere sistematicamente que pretendia apenas investir em depósitos a prazo. A intenção inicial remonta a 2011 e a queixa foi apresentada em julho de 2014, poucos dias antes do colapso do BES/GES.
Esta quinta-feira, o mandatário acrescentou que o seu cliente não tinha intenção de fugir ao pagamento de impostos, mas apenas assegurar que, numa altura em que Portugal estava sob intervenção da "troika", não corria o risco de perder "a poupança da sua vida de empresário". Ricardo Sá Fernandes reconheceu, ainda, que "a perspetiva" que o seu cliente tem "de ir buscar alguma coisa [ao arguido] é muito residual", tendo, por isso, a expectativa de poder ser ressarcido no atual processo-crime.
Arguidos contestam acusação
O caso conta, atualmente, com 25 arguidos, dos quais 20 resultantes da acusação do Ministério Público e cinco reintroduzidos no processo após terem sido ilibados no final do inquérito. Em causa estão centenas de crimes de associação criminosa, corrupção ativa e passiva no setor privado e burla qualificada, entre outros. O ex-banqueiro Ricardo Salgado, de 78 anos, é o que responde por um maior número de ilícitos: 65.
No extremo oposto, está, entre outros, João Alexandre Silva, 62 anos, ex-responsável do BES Madeira e acusado de dois crimes de falsificação de documentos. Esta quinta-feira de manhã, o seu defensor, Artur Marques, pugnou já para que o seu cliente não seja pronunciado, alegando que não foi confrontado pelo Ministério Público com os factos que lhe são imputados antes de ter sido proferido o despacho de acusação, em julho de 2020.
O advogado de Pedro Costa, de 57 anos, à data dos factos ligado à Espírito Santo Ativos Financeiros (ESAF), invocou igualmente questões jurídicas para tentar que este não seja julgado pelos dez crimes de que está acusado, incluindo corrupção passiva no setor privado e burla qualificada.
Paulo Amil apontou ainda diversas incorreções que, no seu entender, constam da acusação, apelando ao juiz Pedro Correia, do Tribunal Central de Instrução Criminal, que aprecie, nomeadamente, "a relevância criminal individual de decisões que são colegiais", como é o caso dos investimentos sob suspeita.
O debate instrutório continua às 14.30 horas, no Tribunal de Monsanto, em Lisboa. O Ministério Público acredita, em síntese, que os 20 arguidos que resultam da acusação terão causado prejuízos de 11,8 mil milhões ao BES/GES ao transformarem o grupo, em seu benefício pessoal, num castelo de cartas sustentado por operações fraudulentas e subornos. Os arguidos negam.