A defesa do ex-contabilista do Grupo Espírito Santo (GES), Francisco Machado da Cruz, considerou esta quinta-feira que "é inaceitável" que o Conselho Superior da Magistratura tenha definido um prazo de oito meses, ultrapassado em fevereiro de 2023, para a conclusão da instrução do processo principal da queda do Banco Espírito Santo (BES)/GES, "fingindo que, no caso concreto, [tal] não condiciona o sentido da decisão" do juiz de submeter ou não os 25 arguidos a julgamento.
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"O Conselho Superior da Magistratura está a determinar necessariamente a pronúncia [acusação após instrução] dos arguidos, porque para isso há tempo. Mas, para não pronunciar, não há tempo, porque [o juiz] tem de ter conhecimento do processo", afirmou Miguel Cordovil de Matos, no terceiro dia do debate instrutório do caso, com "centenas de milhar de páginas", no Tribunal de Monsanto, em Lisboa.
Francisco Machado da Cruz, de 64 anos, responde por 36 crimes de associação criminosa, corrupção passiva no setor privado, burla qualificada branqueamento, falsificação de documento, manipulação de mercado e infidelidade. Mais ilícitos, só o ex-banqueiro Ricardo Salgado, de 78 anos e acusado de um total de 65.
Esta quinta-feira, Miguel Cordovil de Matos desafiou o juiz Pedro Correia - que em setembro de 2022 sucedeu a Ivo Rosa na instrução do caso, iniciada cinco meses antes -, que demonstre que, afinal, conseguiu conhecer o processo, denunciando "a falta de indícios de associação criminosa", imputado ao ex-contabilista em coautoria com mais 11 elementos do GES.
Querem evitar julgamento
O Ministério Público alega que estes criaram uma estrutura destinada à prática dos crimes que terão feito o BES/GES colapsar em 2014, mas, para o advogado, os critérios usados de existência de "canais confidenciais" e estabilidade na organização resultam do "contexto empresarial" do grupo e significam que "o próprio Ministério Público" poderia "preencher os requisitos".
Miguel Cordovil de Matos acredita que, caindo a associação criminosa, terão de cair os restantes crimes, uma vez que, apesar de admitir ter tido "responsabilidade na viciação das contas" do grupo, Francisco Machado da Cruz "não teve qualquer participação" em atos corruptivos ou burlas.
Esta quinta-feira, a defesa de outros três arguidos pugnou também para que os seus clientes não sejam pronunciados. "Claro que esperava que fosse o juiz que assistiu à produção de prova a prolatar a decisão final", atirou Paulo Saragoça da Matta. O debate prossegue na sexta-feira.
INSÓLITO
Advogado confundiu processos e provocou risos
O momento causou risos no Tribunal de Monsanto, em Lisboa. Depois de cerca de dez minutos a defender a inocência do seu cliente, o advogado de Paulo Nacif, acusado de corrupção noutros processos relacionados com o universo BES/GES mas apenas de falsificação de documento no da queda da instituição, foi interrompido pelo juiz, com o alerta implícito de que se enganara no objeto da sua intervenção. Percebendo o erro, o mandatário agradeceu e terminou de imediato a exposição, gracejando que se prepara para "a guerra" e acabara "num campo minado".