Gaiense já tem estratégia de defesa.
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Poucas horas após ter sido detido, no âmbito de um inquérito da PJ que dura há mais de três anos, Rui Pinto já tem estratégia pública de defesa: assume que subtraiu informações confidenciais de clubes de futebol e a ligação ao Football Leaks, mas argumenta que fez tudo ao abrigo de um estatuto de "denunciante" de práticas contrárias à lei, devendo, por isso, ser protegido, beneficiando de uma espécie de imunidade. Invoca, até, a legislação europeia a seu favor e a abertura de investigações em diversos países por práticas ilícitas no futebol.
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Detido em Budapeste, na Hungria, por indícios que levaram a identificá-lo como o hacker que pirateou os emails do Benfica, Pinto confirma através dos seus advogados a intromissão em sistemas informáticos. Porém, não confessa expressamente o roubo dos emails do clube da Luz. Ainda assim, segundo soube o JN, as buscas realizadas anteontem ao apartamento onde vivia permitiram apreender mais de uma dezena de discos de armazenamento, nos quais estavam guardados milhões de ficheiros. As autoridades vão agora confirmar a correspondência com o material desviado do Benfica, bem como do fundo de investimento Doyen e clubes europeus devassados pela plataforma Football Leaks.
O próximo passo da investigação será apurar a existência de cúmplices na extração de informação nos ciberataques e na divulgação dos conteúdos. O Benfica refere não acreditar que Rui Pinto tenha feito algo a "título gracioso", apontando o dedo ao F. C. Porto e ao diretor de comunicação Francisco J. Marques, que deu a cara pela divulgação dos emails, dando origem a um inquérito-crime por suspeitas de tráfico de influências e corrupção.
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Se alguém pagou a Rui Pinto, ainda não há certeza. Para já, as autoridades portuguesas desconhecem se o hacker exercia na Hungria alguma profissão ou outra atividade além de "piratear" clubes e empresas de agenciamento de jogadores.
"Incrível paradoxo"
Os advogados Francisco Teixeira da Mota e o francês William Bourdon dizem, em comunicado, que Rui Pinto irá opor-se à extradição para Portugal, fazendo notar o "incrível paradoxo que resulta da tentativa de criminalização" do cliente, "quando, na verdade, o seu gesto cívico e as suas revelações permitiram a numerosas autoridades judiciais europeias um avanço histórico no conhecimento das práticas criminosas no mundo do futebol".
Fazendo notar que Rui Pinto "foi seriamente ameaçado, sendo o seu silêncio o objetivo de muitos intervenientes", os juristas afiançam que "cumpre os critérios de proteção dos lançadores de alertas [whistleblowers], resultantes das últimas disposições da legislação europeia e de muitos países europeus".
O hacker, de 30 anos, será ouvido por um juiz na Hungria, decidindo-se depois a medida de coação a vigorar durante o período em que não se decidir se se concretiza, ou não, a extradição para Portugal.
Crimes imputados
Rui Pinto foi detido na Hungria ao abrigo de um mandado de detenção europeu, sendo-lhe imputados crimes de extorsão qualificada na forma tentada, acesso ilegítimo, ofensa a pessoa coletiva e violação de segredo. Neste último ilícito, inclui-se o acesso a processos em segredo de justiça, retirados do sistema informático dos tribunais.
Queixa da Doyen
O processo começou em 2015 com uma queixa do fundo de investimento Doyen, com sede em Malta. Refere esta entidade que Rui Pinto, através do advogado Aníbal Pinto, tentou extorquir-lhe meio milhão de euros, sob ameaça de divulgação de documentos comprometedores.
Advogados atacados
Os últimos presumíveis ataques de Rui Pinto tiveram como alvo o escritório de advogados PLMJ, de um dos juristas que defenderam o Benfica no processo e-Toupeira. Foram subtraídos documentos relativos ao processo e-Toupeira, EDP e Operação Marquês. Recentemente, foi fechado o sítio Mercado de Benfica, onde eram divulgados os emails. Só que agora ainda está em funcionamento um sítio com servidor em Anguilla, nas Ilhas Virgens Britânicas.