Defesa diz que acusação de prevaricação é "manifestamente infundada" e que autarca nunca interveio.
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O requerimento de abertura de instrução pedida por Rui Moreira no caso Selminho considera que a acusação se baseia em "ilações" que "não têm qualquer sustentação probatória nos autos e parte de premissas erradas, contraditas por todos os elementos dos autos". E revela que os advogados camarários só souberam da ligação do autarca à empresa seis meses após o princípio de acordo.
Em dezembro, o presidente da Câmara do Porto foi acusado pelo Ministério Público (MP) do crime de prevaricação por, alegadamente, ter violado os deveres de legalidade e imparcialidade para beneficiar a Selminho, uma empresa imobiliária da família e da qual é sócio.
Na contestação à acusação, consultada pelo JN, a defesa nega e garante que o autarca manteve "um total alheamento do litígio" e que a sua única intervenção se resumiu a assinar uma procuração que "não foi acompanhada de qualquer instrução ou sugestão". O assunto foi "conduzido e decidido exclusivamente pelos serviços jurídicos e do urbanismo", frisa.
Procuração polémica
Em novembro de 2013, um mês após ser eleito, Rui Moreira assinou, em nome da Câmara, uma procuração forense no âmbito de um processo que opunha a Autarquia à Selminho. Segundo o requerimento, a defesa admite que foi um ato "que devia ter sido evitado" e que Moreira foi "incauto" porque confiou na opinião do chefe de gabinete, Azeredo Lopes.
Porém, a defesa do autarca lembra que o procurador junto do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto não viu no ato qualquer irregularidade. E se não mereceu censura administrativa, muito menos merecerá censura penal, reservada apenas para comportamentos mais graves.
Munido dessa procuração, a 10 janeiro de 2014 o advogado Pedro Neves de Sousa acordou com a Selminho a celebração de um acordo extrajudicial.
Advogados não sabiam
O requerimento revela que só em junho de 2014, seis meses após o princípio de acordo, é que o advogado soube da relação de Rui Moreira com a Selminho. Alertou então a diretora municipal, Raquel Maia, e a chefe dos serviços jurídicos, Anabela Monteiro, que também nada saberiam.
Em julho, Moreira assina uma declaração de impedimento e a formalização do acordo´já é feita por procuração da vice-presidente, Guilhermina Rego. A declaração só seria anexada ao processo em outubro de 2016. Tiago Rodrigues Bastos e Filipa Elias, advogados de Rui Moreira, frisam que o advogado Neves de Sousa já vinha do mandato de Rui Rio. Moreira garante que "não conhece nem nunca falou" com ele.
Selminho sem benefício
A defesa garante ainda que a Selminho não foi beneficiada, nem houve uma inversão na posição do Município, como aponta o MP. Pelo contrário. Foi no mandato de Rui Moreira que a empresa perdeu a propriedade do terreno. Mais: caso a questão fosse para tribunal arbitral, este ainda teria de decidir se havia direito a indemnização. "Objetivamente, a Selminho ficou numa posição pior. Ou, se quisermos, o Município ficou, objetivamente, numa posição melhor" com o acordo, alega a defesa.
Os advogados referem mesmo que a acusação revela "total incompreensão do funcionamento de uma Câmara Municipal, dos mecanismos de patrocínio forense, da mecânica do processo judicial e uma errada leitura dos documentos assinados pelas partes". E conclui que "os autos não contêm qualquer indício probatório direto que permita sustentar intervenção do requerente" para beneficiar a Selminho, pelo que a acusação "não oferece condições para ser submetida a julgamento".
Perda de mandato
O Ministério Público acusou Rui Moreira de um crime de prevaricação em concurso aparente com outro de abuso de poderes no caso Selminho e requer que o autarca seja condenado à perda de mandato.
Transação judicial
A Câmara e a Selminho acordaram que se o Plano Diretor Municipal não desse resposta às pretensões construtivas da empresa seria decidido num tribunal arbitral se havia lugar a indemnização e de quanto.
Autarca quer inquirir advogado
A defesa requereu a inquirição de Pedro Neves de Sousa, o advogado que recebeu a polémica procuração de Rui Moreira. A acusação já o tinha tentado ouvir mas esbarrou na recusa de levantamente do sigilo profissional por parte da Ordem dos Advogados e do Tribunal da Relação de Lisboa. Os advogados de Moreira consideram que Neves de Sousa pode dar "um contributo muito relevante para a descoberta da verdade" pois são-lhe imputados factos "significativos" que "só podem ser provados ou infirmados por ele". Mas são factos que "põem em causa o cumprimento, por ele, das regras deontológicas a que está obrigado", frisa.