Governos de Portugal e da África do Sul mantiveram contactos antes da detenção do ex-banqueiro. Troca de documentos oficiais entre os países tem de ser efetuada por "via diplomática", através do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e será o ministro da Justiça sul-africano que terá a decisão final sobre a extradição.
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Não foram apenas as autoridades policiais e judiciárias de Portugal e África do Sul que mantiveram contactos antes da detenção de João Rendeiro. Também os governos dos dois países aprovaram a operação que levaria o ex-presidente do Banco Privado Português (BPP) à cadeia.
Dois advogados sul-africanos garantem, ao JN, que tal como acontece em casos de extradição Portugal, o ministro da Justiça da África do Sul terá a última palavra num processo que, embora eminentemente judicial, é igualmente um processo político.
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Logo que João Rendeiro foi localizado, o Ministério Público (MP) português avançou com o pedido de detenção provisória do antigo banqueiro, sustentando-se no artigo 16.º da Convenção Europeia de Extradição, documento que Portugal subscreveu e ao qual a África do Sul aderiu, em 2003. O mesmo artigo obrigou ainda as autoridades nacionais a apresentarem, pela "via diplomática", o acórdão a condenar Rendeiro.
Ou seja, a Procuradoria-Geral da República enviou-o para o Ministério da Justiça e este remeteu-o para o Ministério dos Negócios Estrangeiros. E foi o gabinete do ministro Santos Silva que fez chegar o pedido de detenção provisória ao país escolhido pelo ex-banqueiro para se esconder. Aqui, o documento foi analisado pelo ministro da Justiça, que aprovou a operação levada a cabo na madrugada de sábado.
Detenção provisória não pode ser superior a 40 dias
Ao JN, o presidente do Sindicato dos Magistrados do MP, Adão Carvalho, explica que processo semelhante terá de se repetir para que a extradição seja concretizada. "O MP português tem 18 dias após a detenção para solicitar a extradição e esse pedido tem de ser enviado para o Ministério da Justiça, que o fará chegar ao Ministério dos Negócios Estrangeiros. Só depois é que será enviado para a África do Sul", descreve.
Na sequência dessa diligência, Portugal terá mais 22 dias para descrever os "factos pelos quais é pedida a extradição" e apresentar as "disposições legais" que sustentaram a condenação de Rendeiro. O certo é que este não pode estar mais de 40 dias detido, podendo ser libertado a qualquer momento durante este período.
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Mesmo sabendo que João Rendeiro pode recorrer da decisão judicial de o extraditar - tem 15 dias para o fazer após dela tomar conhecimento -, Adão Carvalho acredita que o ex-banqueiro pode chegar a uma prisão portuguesa no espaço de três meses. "A África do Sul podia recusar o pedido se Portugal aplicasse pena de morte ou perpétua ou se os crimes pelos quais houve uma condenação nos tribunais portugueses não estivessem previstos na lei sul-africana, mas isso não acontece. Por outro lado, se o ministro da Justiça sul-africano já aprovou a detenção provisória não deverá ter motivos para não aprovar a extradição", defende.
Advogados sul-africanos antecipam "mais atrasos"
Cameron Dunstan-Smith e Huneiza Goolam, respetivamente diretor e sócia do escritório de advogados sul-africano Herbert Smith Freehills, têm, desde já uma certeza. "Embora o inquérito de extradição seja realizado por um magistrado, que produz um relatório com uma recomendação do que deve ser feito, será o ministro da Justiça a tomar a decisão final", asseguram, ao JN.
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Estes advogados referem que "existem várias razões pelas quais o ministro pode decidir não aprovar um pedido de extradição". Entre as quais, o facto de o detido estar acusado de "um delito cometido na África do Sul" ou se este Estado tivesse razões para suspeitar que Portugal iria tratar "de forma imprópria" o arguido.
Nada disto parece aplicar-se ao caso Rendeiro que, mesmo assim, pode, salientam Cameron Dunstan-Smith e Huneiza Goolam, requerer outros adiamentos das audiências em tribunal para "se preparar adequadamente ou para solicitar mais informações" relacionados com o seu processo. "É bem possível que se verifiquem mais atrasos [como o verificado nesta segunda-feira]", antecipam.
Os advogados sul-africanos anteveem, igualmente, que João Rendeiro possa recorrer de uma eventual decisão que autorize a sua extradição. Nesse caso, o processo seria transferido para o tribunal superior de Kwazulo-Natal, que não tem qualquer prazo para decretar uma sentença.