A mais recente guerra entre palestinianos e israelitas em Gaza completa dois anos na terça-feira, com dezenas de milhares de mortos e acusações de genocídio contra Israel.
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O conflito pode ter entrado numa fase decisiva na sexta-feira, depois de o Hamas ter aceitado negociar o plano de paz norte-americano, o que levou o presidente Donald Trump a defender a suspensão dos bombardeamentos israelitas.
Esta guerra foi desencadeada pelo ataque sem precedentes de milícias palestinianas lideradas pelo Hamas no sul de Israel a 7 de outubro de 2023, que chocou israelitas e a generalidade da comunidade internacional.
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Derrubadas de madrugada as vedações da fronteira comum, milícias entraram em Israel para atacar várias localidades e uma multidão de jovens num festival, ao mesmo tempo que eram lançados milhares de foguetes contra Israel, com um saldo de cerca de 1200 mortos e 251 pessoas feitas reféns pelos islamitas.
Quando ainda não se conhecia a verdadeira dimensão do ataque terrorista, o primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, líder de um governo de coligação com a extrema-direita e ultraortodoxos religiosos, proclamou que Israel estava em guerra e prometeu aniquilar o Hamas, que responsabilizou pelo pior massacre de judeus depois do Holocausto.
O saldo humano em Gaza está ainda por contabilizar: há mais de 67 mil mortos declarados pelo governo do Hamas, que controla o território desde 2007, mas desconhece-se quantas pessoas estarão sob os escombros das cidades arrasadas.
"A comissão concluiu que Israel é responsável pela prática de genocídio em Gaza", anunciou em 16 de setembro, em Genebra, a jurista sul-africana Navi Pillay, que presidiu a uma comissão independente de investigação da ONU sobre a guerra.
Israel nega as acusações de genocídio e de usar a fome como arma de guerra. Acusa o Hamas de usar a população como escudo e infraestruturas civis como instalações militares.
O Tribunal Penal Internacional emitiu em 21 de novembro de 2024 mandados de detenção por crimes contra a humanidade contra Netanyahu e Gallant, além de três dirigentes do Hamas, que, entretanto, anulou por terem sido mortos.
Manifestação de apoio à Palestina em Barcelona
Foto: Marta Perez/EPA
A guerra em Gaza tem gerado manifestações de solidariedade e de protesto em muitos países, bem como frotas humanitárias, a mais recente das quais foi travada na quinta-feira por Israel, que deteve os mais de 400 participantes, incluindo quatro portugueses.
A guerra opõe o Estado de Israel, fundado em 1948 na Palestina, e o Hamas, acrónimo de Harakat al-Muqawama al-Islamiya (Movimento de Resistência Islâmica), criado em Gaza em 1987.
O Hamas é uma organização política e militar nacionalista, de orientação sunita, que rejeita a existência de Israel e é considerada terrorista por Israel e vários países, incluindo Estados Unidos e a União Europeia, embora alguns apliquem a designação apenas à sua ala militar.
Principais números da guerra entre o Hamas e Israel iniciada a 7 de outubro de 2023, segundo várias fontes:
Faixa de Gaza
O território na costa do Mediterrâneo tem uma população estimada em cerca de 2,1 milhões de habitantes.
Com 365 quilómetros quadrados (41 km de comprimento e um máximo de 10 km de largura), é considerado um dos locais com maior densidade populacional do mundo e foi ocupado por vários povos desde a Antiguidade.
Não tem qualquer ligação direta à Cisjordânia (a margem esquerda do rio Jordão, que muitos israelitas designam pelo nome bíblico Judeia e Samaria), o outro território do Estado da Palestina, tal como definido nos acordos sobre a solução dos dois Estados.
O Hamas controla Gaza desde 2007, quando expulsou do enclave os rivais da Fatah, depois de um conflito armado com centenas de mortos após as eleições de 2006, que venceu.
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A caminho de um Estado Palestiniano
Vários países juntaram-se em setembro à maioria da comunidade internacional que reconhece a Palestina como um Estado, incluindo Portugal.
Um grupo de 10 nações, incluindo alguns com governos críticos da atuação de Israel, como Espanha, além de Reino Unido, França, Canadá, Austrália tomou essa decisão afirmando querer contribuir para a resolução da guerra e para a concretização da proposta dois Estados.
Elevaram para 157 o número de países entre os 193 que fazem parte das Nações Unidas a reconhecer a Palestina como Estado, grupo de onde estão fora os Estados Unidos, a Alemanha, a Itália ou o Japão, entre outros.
Foto: Jack Guez/EPA
Baixas em Israel
Além das vítimas do ataque do Hamas, Israel registou 466 militares mortos e 2.939 feridos desde o início da operação terrestre em Gaza, em 27 outubro de 2023, até 30 de setembro, de acordo com o governo.
Das 251 pessoas raptadas durante o ataque de 7 de outubro, o exército israelita diz que 48 continuam na Faixa de Gaza, mas apenas duas dezenas estarão vivas.
Os restantes reféns, incluindo 36 mortos, foram trocados por palestinianos que estavam em prisões israelitas, a maioria, ou resgatados pelo exército.
Baixas em Gaza
Desde 7 de outubro de 2023, as autoridades de Gaza registaram 66.288 mortos e 169.165 feridos até sexta-feira, segundo dados do Ministério da Saúde do governo do Hamas, considerados fiáveis pela ONU.
O balanço inclui 2.597 mortos em locais de distribuição de ajuda operados pelas forças israelitas desde 27 de maio.
As autoridades de Gaza afirmam que milhares de vítimas estarão sob escombros nas cidades bombardeadas.
A organização Save the Children disse a 6 de setembro que entre as vítimas mortais havia mais de 20 mil crianças, 21 mil tinham ficado com deficiências e 132 mil com menos de 5 anos corriam o risco de morrer de desnutrição aguda.
A guerra causou ferimentos graves (permanentes ou que requerem longos períodos de reabilitação) a 42 mil pessoas, incluindo 5000 amputações, disse a Organização Mundial de Saúde (OMS).
Segundo as Nações Unidas, 1800 profissionais da área da saúde e 562 trabalhadores humanitários, incluindo 376 funcionários da ONU, morreram em Gaza desde 7 de outubro de 2023.
Fome
As autoridades de Gaza afirmam que 459 palestinianos morreram por desnutrição desde o início da guerra, incluindo 154 crianças, segundo a agência espanhola EFE.
Um organismo apoiado pela ONU declarou oficialmente a fome na província de Gaza em 22 de agosto, o que aconteceu pela primeira vez no Médio Oriente.
Foto: Eyad Baba/AFP
Israel também impôs restrições à entrada de ajuda humanitária por camiões da ONU, um bloqueio que se mantém há mais de sete meses.
De acordo com a ONU, 49% das pessoas em Gaza têm acesso a menos do que o padrão mínimo de emergência de seis litros de água potável por dia, para beber e cozinhar.
Infraestruturas
Num relatório de 2 de outubro, a ONU assinalou que 78% das construções da Faixa de Gaza estavam destruídas ou danificadas no final de junho.
No setor do comércio e indústria, o nível de destruição ou de danos dos 48.987 estabelecimentos registados era de 88% em fevereiro.
Em julho, 77% da rede de estradas estava danificada ou intransitável.
Saúde
Segundo a ONU, 39% (14 de 36) dos hospitais estavam parcialmente funcionais no final de setembro: oito na cidade de Gaza, três em Deir al-Balah e três em Khan Younis, mas nenhum a norte de Gaza e em Rafah (sul).
Na mesma altura, 63% (10 de 16) dos hospitais de campanha estavam parcialmente funcionais, dos quais um em Gaza, quatro em Deir al-Balah, quatro em Khan Younis e um em Rafah, mas nenhum no norte.
Ao nível dos centros de cuidados de saúde primários, 35% (62 de 179) estavam parcialmente funcionais.
Mais de 15.600 pacientes em estado crítico necessitavam de assistência médica fora da Faixa de Gaza no final de setembro.
Líbano, Irão e Iémen
Israel matou vários altos membros do Hamas e aliados regionais desde o início da guerra, incluindo o líder do Hezbollah libanês, Hassan Nasrallah, bem como o seu sucessor, Hashem Safieddine, segundo uma lista do jornal The Times of Israel.
Também foram mortos o comandante da Guarda Revolucionária do Irão, general Hossein Salami, e o chefe do governo dos rebeldes houthis do Iémen, Ahmed Al-Rahawi, entre outros.
No Hamas, destacam-se o líder político, Ismail Haniyeh, o líder em Gaza, Yahya Sinwar, e o chefe da ala militar, Mohammed Deif.
Jornalistas
O Comité para a Proteção dos Jornalistas (CPJ) registou a morte de pelo menos 237 jornalistas e profissionais da comunicação em Gaza, Iémen, Líbano, Israel e Irão até 26 de setembro.
Deste total, 235 foram mortos por Israel: 195 palestinianos em Gaza, 31 iemenitas no Iémen, seis libaneses no Líbano e três iranianos no Irão.
Dois israelitas foram mortos em Israel pelo Hamas, acusado também de "assédio e intimidação" de jornalistas dentro de Gaza.
O CPJ registou também 152 feridos, dois desaparecidos, 92 detidos e ainda casos de agressões, ameaças, ciberataques, censura e assassinatos de familiares, no "período mais mortal para jornalistas" desde que a organização começou a recolher dados em 1992.