O presidente da Associação Europeia de Medicina Perinatal afirmou, esta sexta-feira, que a taxa de cesarianas nos hospitais privados é "algo que nos envergonha" e alertou que, caso seja colocada a hipótese de transferir grávidas para o setor privado devido ao fecho de algumas urgências de obstetrícia e ginecologia em hospitais públicos, "tem de haver algum controlo sobre estas práticas que não são consideradas boas práticas".
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"Há um aumento enorme dos partos que ocorrem nos hospitais particulares. Acho que os hospitais particulares têm dado algumas respostas boas, mas há outros indicadores de qualidade dos cuidados obstétricos, como a taxa de cesarianas que, a nível europeu, é algo que nos envergonha. A palavra é forte, mas é mesmo isso que se passa", afirmou Diogo Ayres de Campos, recordando que Portugal tem uma taxa de 66% de cesarianas nos hospitais particulares , como o JN escreveu em abril, e "não há uma grande tendência para decrescer".
"Acho que se vamos, de facto, alargar para os hospitais particulares [o encaminhamento de grávidas] - é uma decisão política que não me cabe a mim - tem de haver algum controlo sobre estas práticas que não são consideradas boas práticas. São consideradas más práticas a nível da Organização Mundial de Saúde e das sociedades científicas internacionais", alertou o especialista, apontando ainda o dedo aos decisores políticos.
"Aparentemente, também não há nas instituições do Estado nenhuma vontade ou capacidade de fazer algum controlo sobre estas práticas", criticou.
Diogo Ayres de Campos, que foi recentemente indicado pela ministra da Saúde para presidir à comissão de acompanhamento de resposta em urgência de ginecologia, obstetrícia e bloco de partos, admitiu ainda que transferir grávidas "vai contra as expectativas das mulheres".
Desejável é não haver transferências
"Ter um funcionamento em rede é excelente mas, de facto, vai contra as expectativas das mulheres grávidas que querem ter o seu parto num determinado hospital. De acordo com a nossa lei, podem escolher o hospital onde têm. Na teoria porque depois, na prática, estão sujeitas às contingências e às transferências", referiu o especialista, afirmando que o desejável é não haver transferências.
"Havemos de ter sempre algumas transferências baseadas na capacidade de o hospital dar resposta a um certo problema, nomeadamente cuidados intensivos maternos ou neonatais. Na Europa toda existem transferências, mas são inferiores a 1% das grávidas. Nós, de facto, temos tido, segundo o que é noticiado, quase 2% de transferências entre hospitais. Acho que isso não é algo que queiramos ter porque, de facto, vai contra todas as expectativas das grávidas e o que possam escolher em relação à sua gravidez e partos", sublinhou.