Paulo F. Silva, antigo jornalista do "Jornal de Notícias" e atual assessor de comunicação da Câmara de Gondomar, morreu este domingo, com 59 anos.
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Vítima de cancro, faleceu este domingo no Instituto Português de Oncologia, no Porto, onde estava internado desde sexta-feira.
Enquanto jornalista, começou a trabalhar ligado ao desporto automóvel, passando ao longo da carreira pelo "AutoSport", "O Jogo" e "Jornal de Notícias". Criou e dirigiu o semanário "A Manhã", em Gondomar, e era agora assessor de Comunicação da Câmara de Gondomar. Era ainda vice-presidente da Casa da Imprensa, uma associação mutualista dos profissionais da comunicação.
Depois de uma primeira experiência profissional como funcionário das Finanças, ingressou nos quadros do jornal desportivo "O Jogo", e em 1994 passou para o JN, em que foi coordenador das secções Sociedade e Grande Porto e editor das secções País e Mundo.
Nascido em Angola, em 1960, foi para o Porto em 1975 mas acabou por ser a ligação a Gondomar, e em particular a Rio Tinto, onde residia, a marcar o seu trabalho e o seu envolvimento em termos de cidadania. O semanário "A Manhã", projeto que sucedeu à criação da editora "Letras de Ferro", enquadra-se nessa ligação, que se mantinha forte ainda hoje, através do seu trabalho no Gabinete de Comunicação da autarquia.
Domingos de Andrade, diretor do "Jornal de Notícias", nota que "o Paulo não era só um jornalista dedicado e um cidadão preocupado com as desigualdades dos dias", descrevendo-o ainda como alguém que "tinha uma decência humana e profissional que vai sendo cada vez mais rara". Vincando que o JN tem para com ele "uma gratidão enorme que não pode ficar pelas palavras vãs", Domingos de Andrade deixa a garantia de que o seu legado será honrado.
Deixa três filhos, dois rapazes e uma menina.
Recordar um amigo
O Paulo falava pouco. Tinha um sorriso tranquilo. Gostava de ouvir. Foi delegado sindical e esteve sempre na linha da frente das batalhas travadas pelos trabalhadores no "Jornal de Notícias". Enquanto dirigente do Sindicato dos Jornalistas, empenhou-se na dignificação do jornalismo e das condições de trabalho.
Nos plenários, nas lutas que travámos no JN, era quase sempre dos últimos a falar. Gostava de ouvir. Media as palavras, expressava-se de forma serena e ponderada, deitando acalmia no sangue fervente, especialmente dos mais novos, mais inexperientes, mais faladores. Promovia consensos, soluções.
Saiu do JN em 2009, mas o JN nunca lhe saiu do sangue. Nem os amigos. Quando podia, entre os vários afazeres que desenvolveu após deixar a redação, aparecia, de preferência à sexta-feira, para comer uma francesinha com os ex-camaradas de trabalho.
A "Caverna", onde se cumpria a tradição da francesinha, sucumbiu, em julho de 2019, às mãos do turismo. Nessa altura o Paulo já estava doente, já não se juntava aos amigos, entre os quais alguns que chefiou, a quem transmitiu valores de ética, respeito pela profissão, pelo leitor e pelo rigor, que, hoje, como chefes, replicam na redação do JN.
Desde que ficou doente, deixou de aparecer. Respondia às mensagens, mas não queria que os amigos o vissem, esmurrado pela doença. Quis manter a dignidade, à custa do nosso afastamento. O sofrimento dos amigos não foi menor por isso. Entendemos, aceitamos. E agora percebemos. A imagem que nos fica é aquela que ilustra este texto - o cabelo encaracolado, num desalinho quase cuidado, a barba grisalha, um ar poético e aquele sorriso entre o tranquilo e o matreiro.