A subida das taxas de juro e do custo de vida são o motivo para os jovens entregarem as casas aos bancos, adiantam os movimentos que este sábado vão protestar em seis cidades portuguesas.
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O número de portugueses que devolvem a casa ao banco porque não conseguem pagar o crédito à habitação está a aumentar, denunciaram ao JN três movimentos que vão participar no protesto deste sábado que se realiza em várias cidades da Europa sob o mote "Casa para Viver".
O aumento do custo de vida e a subida das taxas de juro estão a gerar um movimento repentino de cidadãos, sobretudo jovens, que entregam a casa ao banco para pagar o crédito, com maior proporção nos primeiros meses deste ano.
O canal de testemunhos do movimento Porta a Porta tem cada vez mais casos destes, como confirma ao JN André Escoval, o seu porta-voz: "Dos testemunhos que temos recebido, o que temos visto é que as dificuldades acrescidas estão a levar muita gente a tomar essa opção de entregar a casa". Outros "dizem claramente que vão deixar de pagar o crédito ou a renda", acrescenta André, que constata que o fenómeno da entrega da casa aos bancos começou a ganhar dimensão "desde dezembro".
A tendência recorda-lhe o tempo da troika, em que "os jovens entregavam a casa ao banco e voltavam para a casa dos pais". Com uma diferença: é que agora "o processo é mais súbito", constata, pois as pessoas "passaram de uma situação estável para o fim da linha em poucos meses".
Bernardo Alves, porta-voz do movimento Habitação Hoje, corrobora: "Esse problema tem acontecido e era evidente que ia acontecer, porque o custo de vida está a subir e as pessoas estão a perder rendimento". Este responsável adianta que "também há muitos casos de pessoas com problemas de despejos" em contratos de arrendamento. Daí que considere que os dois apoios destinados ao crédito e à renda, lançados pelo Governo, "são anedóticos".
Segundo Vasco Barata, da associação pelo direito à habitação Chão das Lutas, as medidas do Governo são "uma cortina de fumo" insuficiente para resolver o problema: "Temos tido relatos de pessoas que ameaçam entregar a casa".
Stock de créditos baixou
Todos os movimentos associativos que falaram ao JN dizem que o fenómeno é recente e só se começou a notar em 2023. No ano passado, o stock de imóveis dos bancos e a proporção de créditos de risco até diminuiu, segundo os relatórios e contas consultados pelo JN. No entanto, os primeiros números de créditos relativos a 2023 parecem demonstrar o início do fenómeno da entrega de casas aos bancos.
Isto porque, em janeiro e fevereiro deste ano, o stock de empréstimos a particulares baixou, invertendo-se a tendência de crescimento verificada desde junho de 2021, segundo o Banco de Portugal. Assim, os bancos têm menos dinheiro emprestado, não porque tenha baixado a concessão de novos créditos à habitação - que até aumentou em comparação com janeiro do ano passado -, mas sim porque o volume de amortizações foi maior.
Não existem ainda dados que permitam perceber a origem deste aumento das amortizações. Sabe-se apenas que incluem quem amortizou para baixar ou eliminar a prestação, quem entregou a casa ao banco porque não podia pagar o crédito e ainda quem teve de vender a casa a expensas próprias para liquidar o empréstimo que não conseguia pagar.
É devido a fenómenos como este que várias cidades europeias se vão manifestar, hoje, a partir das 15 horas. Em Portugal, estão agendados protestos em Lisboa, Porto, Braga, Aveiro, Coimbra e Viseu.
Bernardo Alves explica que os manifestantes vão pugnar pelo direito à habitação, pelo direito à cidade e pelo "fim da exploração através do aumento do custo de vida". Defendem regulação de preços neste e noutros setores "essenciais", mais habitação pública, mais alojamento estudantil, aumentos de pensões e o fim dos despejos.
Taxa média de juro dos novos créditos subiu para 3,56%
Os créditos à habitação com taxa variável contraídos em Portugal em fevereiro tiveram uma taxa de juro média de 3,56%, revelou ontem o Banco de Portugal. Esta subida reflete o aumento recente das taxas Euribor, pois, há um ano, esta média era de 0,59%. Como consequência, o regulador calculou que a taxa de esforço média para pagar o crédito subiu de 23,5%, em 2021, para 25,1% no ano passado.