Aumentou o tempo de espera por consultas de psiquiatria e psiquiatria da infância e adolescência. Há utentes a esperar um ano pela primeira consulta. No caso de um utente "muito prioritário", a espera chega aos 77 dias, mais do dobro do limite imposto pela Entidade Reguladora da Saúde (ERS). E a procura por linhas de crise continua elevada, na ordem das 23 mil chamadas anuais.
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O panorama na área da saúde mental do Serviço Nacional de Saúde (SNS) piorou - segundo o Relatório Anual de Acesso a Cuidados de Saúde de 2021, pelo menos 89,3% das consultas cumpriam o tempo máximo estipulado. Agora, segundo os dados analisados pelo JN, essa percentagem ronda os 50%. Especialistas alertam que a resposta atempada só se resolve com maior capacidade técnica.
Atualmente, na especialidade de psiquiatria da infância e adolescência, consultando o Portal dos Tempos Médios de Espera do SNS, é possível aferir que, independentemente do nível de prioridade, metade das consultas realizadas não cumpre o tempo máximo de resposta garantido (TMRG) - uma métrica definida pela ERS para garantir o acesso "a cuidados de saúde em tempo considerado clinicamente aceitável", lê-se no portal do SNS24. No caso do Hospital de Braga, a consulta de prioridade "normal" de psiquiatria da infância e adolescência tem uma espera média de 357 dias, mais do dobro dos 150 dias recomendados.
Triplo do tempo ideal
No caso dos adultos, quase metade das consultas "muito prioritárias" são feitas fora do tempo máximo. Com um limite estipulado para 30 dias, há pessoas a esperar 76 dias (caso do Centro Hospitalar Póvoa de Varzim/Vila do Conde). Nas consultas "prioritárias", em que o TMRG é de 60 dias, os pacientes do Hospital Beatriz Ângelo esperam agora 182 dias - três vezes mais do que o recomendado. Também na psiquiatria um doente com prioridade "normal" pode chegar a esperar quase um ano (336 dias, no Hospital Distrital de Santarém).
Questionado pelo JN, o Ministério da Saúde não comenta o agravamento dos tempos de espera. A tutela garante "estar em curso a recuperação da capacidade dos serviços, através do aumento dos recursos humanos". O vice-presidente da Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental (SPPSM), Albino Oliveira-Maia, acredita que o aumento do tempo de resposta é consequência, por um lado, do aumento da procura, que leva a uma sobrecarga, e, por outro, do "esvaziamento da capacidade técnica", com várias transferências para o serviço privado.
As chamadas para as linhas de crise psicológica provam também que os pedidos de ajuda continuam elevados. Em 2022, foram 23 570, no total das seis linhas analisadas pelo JN. A estas, juntam-se as 64 772 efetuadas para a Linha de Apoio Psicológico (LAP) do SNS 24. De 2021 para 2022, regista-se uma diminuição ligeira do número de chamadas (menos 1,73% e menos 7,39%, nas linhas e na LAP, respetivamente).
Face ao elevado número de pedidos de ajuda, a psiquiatra Ana Matos Pires sublinha que a maioria é feita sem um diagnóstico formal. "As chamadas aumentaram porque se fala mais de saúde mental. O que não significa que estejamos mais doentes". A médica psiquiatra aponta como fragilidades a pouca abrangência horária das linhas e o não encaminhamento, afirmando que é necessário criar uma linha pública focada em pensamentos suicidários.