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A crise política instalou-se, de uma forma surpreendente, na semana passada. O modelo de separação de poderes permitiu à justiça, através da PGR, formular um conjunto de acusações a elementos muito próximos do primeiro-ministro. Inevitavelmente a situação levou à demissão deste e à necessidade de o presidente da República tomar uma decisão no sentido de ultrapassar uma crise cuja origem nada tinha de política. Este optou por dissolver a Assembleia da República, pese embora as dúvidas de muitos dos seus conselheiros de Estado.
Com efeito, podemos dizer que o regular funcionamento das instituições, que a Constituição exige, estava mesmo em causa.
Nos últimos tempos muitos vieram logo precipitar-se em avaliações sobre o que se passou e pode passar, afirmando a ideia de uma espécie de golpe de Estado judicial.
A relação entre a política e a justiça vive de muitos mitos intencionais e equívocos.
Desde logo, o primeiro, que é a existência de demasiado Estado na vida das pessoas e das empresas.
O segundo será não estar devidamente regulamentado o chamado lóbi que permitiria distinguir o que é ou não tráfico de influências. Parece que, finalmente, podem existir condições para tal.
O terceiro será deixar claro a necessidade de existir uma reforma de justiça que não coloque em crise os princípios em que assenta o nosso Estado de direito, muito construído no tempo do cavaquismo, mas permita esclarecer o papel dos vários agentes que ali atuam.
Esta talvez seja a prova mais dura do nosso regime democrático quando nos preparamos para celebrar os 50 anos do 25 de Abril de 1974.
No plano político, não será fácil encontrar uma maioria parlamentar com uma solução coerente, maioritária e estável.
À Esquerda, o Partido Socialista terá de explicar a causa do sucessivo insucesso de primeiros-ministros como Guterres, Sócrates ou Costa. Seja quem for o novo líder, terá de passar por esse teste do algodão. Um Governo do PS com o Bloco de Esquerda vai trazer de certeza aquilo que o 25 de Novembro pretendeu afastar.
À Direita não existe muito entusiasmo. O PSD procura agora agregar e preparar o regresso ao poder mesmo sabendo que vai assistir ao fortalecimento do Chega.
A questão agora é como Portugal vai exigir de todos e de que forma a credibilização das instituições vai permitir ao país criar riqueza e afastar uma crise económica permitindo distribuir essa riqueza pelos seus cidadãos.
Ao mesmo tempo Portugal precisará de um Governo com um Parlamento forte e com opções políticas claras, desejando que o próximo primeiro-ministro não seja objeto de qualquer outro caso judicial.
Os portugueses querem instituições prestigiadas e credíveis. A crise segue dentro de momentos para eleições.