Portugal chegou tarde ao modelo de Estado social por força do seu atraso económico e de um obsoleto modelo de desenvolvimento. A revolução do 25 de Abril de 1974 acelerou, inevitavelmente, essa corrida ao Estado social. Graças a governos do Partido Socialista ou do Partido Social Democrata foi possível construir as bases económicas e financeiras desse novo modelo de contrato social.
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Acontece que, entre 1976 e 2023, o Mundo mudou, várias vezes, no que foi acompanhado pelas alterações sociais e pelas evoluções tecnológicas.
Certo é que foi a Esquerda que liderou mais vezes o país do que o centro-direita, mas também é verdade que foram os governos de Cavaco Silva que imprimiram o maior pendor reformista às transformações sociais e económicas de Portugal.
Após a adesão à Europa (1986), e com os fundos comunitários, foi possível mudar a imagem do país e possibilitar às populações um progresso que as circunstâncias exigiam de uma forma determinada.
Acontece que, devido à ausência sucessiva de reformas estruturais e a algum calculismo político, começam a ganhar uma grande dimensão crítica os problemas em volta das funções do Estado.
Desde logo nas suas funções de soberania, onde a ausência de meios para as forças de segurança e as forças armadas evidenciam as dificuldades orçamentais do Estado.
Nas suas funções empresariais o exemplo da TAP e da Efacec refletem essa ausência de estratégia.
Nas funções sociais essa crise parece ser incontornável. Desde a educação e o problema dos professores, ao Serviço Nacional de Saúde e às urgências encerradas ou à falta de recursos humanos, terminando na habitação e numa ausência de respostas integradas ao problema.
Tudo isto se agrava quando se percebe que temos um complexo problema demográfico, uma população envelhecida, cujas exigências serão cada vez mais elevadas, e os mais jovens começam a desistir de Portugal procurando noutras paragens solução para os baixos salários. Infelizmente hoje ter um emprego e um salário não quer dizer que se consegue fugir à pobreza e à sua institucionalização, necessitando ainda de mecanismos de transferências sociais que só adiam a resolução do problema. Imagem triste de toda esta situação acaba por ser o consumo de drogas na via pública que não prestigia ninguém.
Se em 1974 os três D representavam Democracia, Desenvolvimento e Descolonização, no tempo da troika representaram Défice, Desemprego e Dívida, hoje representam Demografia, Digitalização, Descarbonização.
Os nossos responsáveis políticos devem compreender que o Mundo não vive à sua volta mas, antes, eles é que vivem à volta do Mundo.
Precisamos de coragem para mudar o paradigma. Quase 50 anos depois, o país volta a estar, outra vez, numa encruzilhada.
*Professor universitário de Ciência Política