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Porventura tolhido pela vaidade de estar investido em presidente da sua Comissão de Honra, vivi este ano ainda mais intensamente as Festas da Agonia. Quem diz que a cultura popular está em crise nunca foi a Viana, nunca viveu e experienciou a extraordinária e impressionante força coletiva e intergeracional da Romaria.
Tive também o privilégio da imersão notívaga da Senhora do Socorro da Régua e guardo fortes memórias das Feiras Novas de Ponte de Lima ou do São Bartolomeu de Ponte da Barca. Todas estas manifestações são exemplos de uma riqueza humana e patrimonial, reveladora de identidades antropológicas coletivas e diversificadas, que se renovam e que têm um brilhantismo peculiar no Norte. São amarras que se estabelecem aos lugares, vínculos que se sentem entre gerações, elos de símbolos que geram atividades e riqueza.
Em Viana, as Festas da Senhora da Agonia têm “o sentido pleno, a um tempo denso e exaltante”, como disse Moisés Martins; “são as maiores e mais importantes que já se viram”, segundo Miguel Esteves Cardoso; e consubstanciam, na expressão de Amadeu Costa, que “Viana é amor”. Ali, está o Minho por inteiro, nesses dias vestido e dourado a rigor para abraçar o país e o Mundo, com um acolhimento único. Abraço genuíno das pessoas que fazem a festa no que vestem, cantam, dançam e criam na arte efémera de tapetes de sal e flores ou na forma como abrem as suas casas. Ali, estão todos, os de cá e os de fora; os que já viveram muitas romarias e os que se iniciam e que cada vez mais a fazem, trajando com a mesma naturalidade com que se vestem de acordo com a sua personalidade ou que partilham a presença no festival de Paredes de Coura. Ali, está a cultura popular e a cultura literária e artística, diluindo fronteiras artificiais.
Este é um Norte e um país diferente e melhor, possível por uma educação que leva 50 por cento da juventude ao Ensino Superior; e pela disseminação da cultura musical que se faz em academias de cidades, bem como em notáveis instituições de vilas, como, por exemplo, o Conservatório da Filarmónica de Ferreirim (Sernancelhe) ou a Banda da Carvalheira (Terras de Bouro).
Que todas as Senhoras, da Agonia, dos Remédios, do Socorro..., nos iluminem contra as tentações da uniformização e do centralismo culturais - e que, através de uma governação de maior proximidade, potenciem a força e a generosidade desta juventude que quer e tem direito a ser, simultaneamente, cidadã do Mundo e da sua terra.