Corpo do artigo
Acossado pelas dúvidas e suspeições em torno da sua participação numa imobiliária familiar, o primeiro-ministro foi ao Parlamento abrir o livro. Aliás, vários livros: o das memórias pessoais e o das faturas. Revelou, como se impunha, toda a informação sobre a Spinumviva, com um grau de detalhe pouco usual, distribuiu aos deputados o histórico dos seus rendimentos nos últimos 15 anos mas, no essencial, defendeu a sua posição, da família e, sobretudo, garantiu a lisura de procedimentos, mesmo que, ao contrário do que pedira o PS, tenha recusado revelar a totalidade dos clientes da empresa agora gerida pela mulher e pelos filhos.
O debate sobre a moção de censura do Chega (uma cortina de fumo condenada à nascença) evoluiu para uma discussão sobre espelhos e telhados de vidro. O PSD divulgou o registo de interesses dos deputados do Chega, insinuando que alguns também tinham participações em imobiliárias; Luís Montenegro devolveu a exigência a Pedro Nuno Santos, lembrando que também não queria saber quem eram os clientes das empresas do universo familiar do secretário-geral do PS; e, no final, aquilo que ficou do acalorado bate-boca foi a certeza de que a nuvem negra que paira sobre a cabeça do primeiro-ministro e de alguns membros do Governo com participações em imobiliárias não vai dissipar-se com o vento. Não porque tenha sido provado algum crime de corrupção, mas porque se prevê um agravamento da corrosão da credibilidade do Executivo. Por isso, a única escapatória possível parece ser mesmo a suspensão da lei dos solos. Caso contrário, continuarão todos a atirar pedras aos telhados de vidro uns dos outros. E ninguém sairá bem dessa intifada imobiliária, sobretudo Luís Montenegro e o Governo.