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De um lado, uma mulher muçulmana, cabeça e torso tapados de negro, como se fosse um fantasma inexpressivo; do outro, uma jovem luzidia, olhos claros, ombros à vista, projetando liberdade e autoestima. No meio de ambas, em letras garrafais, a pergunta: "Que Almería queres?". Associadas à mulher muçulmana, as siglas do PSOE e do PP; junto à alegada mulher "pura" (gerada com inteligência artificial), as siglas do Vox.
A campanha de ódio da extrema-direita em Espanha é feita às claras há bem mais tempo do que entre nós, mas agora foi transposta para cartazes de rua na província de El Ejido. O partido liderado por Santiago Abascal justifica assim as mensagens: "Com esta campanha, o Vox denuncia e luta contra todas as práticas culturais que prejudicam e denigrem a mulher, como o matrimónio forçado e a mutilação genital feminina". Leia-se: os muçulmanos são uns bárbaros, tratam as mulheres como lixo e não os queremos entre nós. Escusado será dizer que a desfaçatez foi prontamente contestada (até legalmente) por todos os partidos, o que não invalida que tenha cumprido a sua missão primordial e única: espalhar o ódio, a desinformação e a dúvida.
De resto, este é o maior perigo associado à ascensão dos extremistas: sentirem que a legitimação da sua agenda pelo voto ajudou a normalizar as enormidades que proferem. Para já, o Chega ainda não teve a ousadia de lançar cartazes desta índole, ficando-se pelas tiradas populistas contra os adversários, mas não faltará muito para que este caminho se faça. A cartilha internacional tem sido seguida com obediência desde o primeiro momento, a tal ponto que, por vezes, somos levados a acreditar que a imigração é o maior problema de Portugal. Como se combate isto? Falando mais da imigração, mas dando contexto ao assunto, sem moralismos nem ingenuidades. Informando os eleitores, dizendo-lhes aquilo que eles não querem ouvir. Será custoso e prolongado, mas há centenas de anos que os ilusionistas têm a vida facilitada.