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Temos assistido, um pouco por todo o lado, a manifestações que, cada vez mais, se parecem com atos de guerra. O pretexto serve sempre o objetivo de pessoas que entendem que devem vandalizar carros de cidadãos pacatos, pegar fogo a caixotes do lixo, que nada mais são do que reflexo da nossa sociedade de consumo, e sempre aproveitam para saquear lojas de produtos de alta tecnologia ou de roupas de marca. Este foi o exemplo recente de Paris, mas poderia ter acontecido em qualquer outro local da Europa ou dos Estados Unidos.
Ao mesmo tempo, no Leste da Europa, um grupo de mercenários, o chamado grupo Wagner, decidiu revoltar-se contra o senhor Putin. Sem sucesso, mas com danos colaterais. Neste momento, ninguém ainda percebeu o que foi esta encenação do senhor Yevgeny Prigozhin e o que aconteceu também ao general Surovikin.
Estamos no tempo da rebelião dos Senhores da Guerra ou chegou o momento de uma profunda crise da autoridade democrática? Aqui começam as diferenças entre Paris e Moscovo e os respetivos sistemas políticos e jurídicos.
O afirmar da autoridade democrática, em Paris, tem de refletir também uma ideia de Estado de direito que deve respeitar a tal cultura de protesto francesa, mas não pode aceitar o clima de destruição e insubordinação civil que a anarquia de grupos radicais acaba por desenvolver. Aparentemente, o polícia francês falhou no exercício da sua autoridade democrática, mas isso não pode manchar as forças de segurança que, todos os dias, defendem a República e os direitos, liberdades e garantias de todos os cidadãos.
A lei aplica-se a todos sem diferenças. Ao invés, o que aconteceu em Moscovo revela uma cultura de autoritarismo que não respeita as regras do Estado de direito e parece querer impor uma cultura de medo junto de todos os que entendem discordar.
Qualquer que seja o campo onde podemos avaliar estes comportamentos sabemos que, nas nossas democracias, ninguém está acima da lei e uma má atuação das forças de polícia merece o firme repúdio e a solidariedade de todos aqueles que acreditam nos valores do respeito e da dignidade humana.
As tragédias que estes senhores da guerra vão trazendo às nossas comunidades assemelham-se ao comportamento dos bárbaros, nos primórdios dos nossos tempos, ainda antes da Idade Média, que tudo saqueavam e tudo destruíam.
Esses comportamentos acabam por ajudar ao crescimento da árvore do populismo antidemocrático, aquele que não respeita a liberdade do outro e pretende impor a sua visão do Mundo.
Penso que foi Anne Applebaum que escreveu que “o ceticismo sobre a democracia liberal é normal. O apelo ao autoritarismo é eterno”.
Temos de aprender com a história e compreender que uma sociedade sem elevador social é uma sociedade sem esperança. Afinal, quem semeia ventos colhe tempestades, diz o povo.
*Professor universitário de Ciência Política