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Temos vindo a assistir a uma maior degradação da capacidade técnica e política da nossa administração pública. Com efeito e apesar da criação da CRESAP, como entidade para o recrutamento e seleção dos quadros de topo da administração central, a fragilidade da legislação que a suporta tem permitido, nos últimos tempos, ao Governo viver, ao nível de Direção-Geral, em situação de nomeação precária de responsáveis técnico-políticos.
Desta forma tem sido possível ajudar ao desenvolvimento de alguns CV que, de outra maneira, não teriam as competências necessárias para participarem em posteriores concursos para o efeito.
O país foi alertado, recentemente, para a ausência de concurso para o preenchimento da vaga de diretor-geral da Saúde, um dos mais prestigiados e importantes cargos de topo da nossa administração. Tal situação obrigou o Governo a reagir com a nomeação de um subdiretor-geral e a solicitar à dra. Graça Freitas para não abandonar, de imediato, as funções.
Depois das falhas ao nível do pessoal técnico dos gabinetes ministeriais, dos que ocupam lugares de administração em empresas públicas, assistimos agora à desertificação dos mais elevados cargos da administração pública. Não podemos esquecer que, nos termos da Constituição, o Governo é o órgão superior da administração pública.
Portugal precisa de definir o que pretende para o topo da sua administração pública onde existe uma necessária complementaridade entre a competência técnica e a sensibilidade política. O que se espera de um diretor-geral é que seja solidário com o Governo, cumprindo as diretivas assentes no seu programa, sufragado pelo Parlamento, tenha capacidade técnica, no sentido de dominar os principais problemas e as tendências do setor e saiba o que é sensibilidade política.
Será esta complementaridade que poderá dar solidez e conhecimento à administração, evitando o chamado outsourcing de pensamento e de conhecimento que temos vivido nos últimos tempos.
Até ao final do século XX ainda foi possível encontrar na administração pessoal com este perfil que os chamados "jobs for the boys" acabaram por eliminar.
Esperemos que um próximo Governo consiga fazer a reforma do Estado começando pela administração pública. Será necessário perceber que as funções de soberania do Estado só a este respeitam, as funções sociais podem ser partilhadas com as IPSS e as funções empresariais devem ser escrutinadas na sua real necessidade e no seu papel social. Ficamos então à espera de quem terá coragem para fazer esta reforma antes de se falar em regionalização.
*Professor Universitário de Ciência Política