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Ela já não é ela, mas uma outra. A culpa da incredulidade é só minha, não da Alexandra Lencastre que continua certamente a ser a mesma quando se vê por dentro da pele. Por fora deixou de ser a que conhecemos, parece uma miúda de trinta anos com uma pele perfeita, lábios novos, carnudos sem o serem excessivamente. Podia ser uma colega mais velha do meu filho de 27 anos, a professora estagiária na nova temporada do "Morangos com açúcar" ou uma modelo da Vista Alegre. Viu as imagens após as operações plásticas? O seu sorriso de felicidade infantil ou, quem sabe, de irónico sarcasmo? Do género: vejam bem, tenho 60 anos e estou de regresso à imaginação dos que imaginam. Aposto que sim, mas a Alexandra já não é a Alexandra. É como eu quando tiro os óculos, fico outro, um irmão desasado de mim próprio. Mas ela não se parece com a que existia antes, não passariam sequer por irmãs. Ocorrem-me perguntas: será que estava tão farta de si própria que quis ser outra? O que acontece quando nos olhamos ao espelho e não temos a mesma cara? É como se reencarnássemos e pudéssemos voltar atrás e emendar o que fizemos mal? E os nossos filhos o que veem quando nos veem? O que aconteceria se eu fosse Leonardo DiCaprio por um dia? Seria excelente, compro já a ideia. E por toda a vida? Aí seria assustador, um esvaziamento, um apocalipse. Passaria a ser um invólucro esplendoroso vazio e amputado. Uma lobotomia física ambulante, um homem na sala de espera dos loucos que ainda não sabem que o são.