Corpo do artigo
Querido Omar, querida Malika, Rahid, Nicky e Shivam, não tem sido fácil, eu sei. Há um polvo de maldade, com tentáculos de dentro e de fora, a tentar abraçar-vos sem largar. A impingir-vos uma bagagem daquelas que, infelizmente, não se roubam nos aeroportos, ficam para sempre. A manchar. A denegrir. A pesar e a ferir. Isto também me dói, Sahíra, e a tantos que conheço.
Ao peso da saudade e ao vazio de um lugar pouco conhecido, juntam-se o desconforto dos olhares receosos, os comentários irónicos, os dedos constantemente apontados, na maior parte das vezes sem justificação. E sabes, Yousef, eu juro que cresci num país que sabe receber, mimar, amar. Que partilha o que tem mesmo ficando a perder, que não desiste de fazer rabiscos num papel até conseguires perceber a direção do teu destino. O Portugal que conheço era assim.
Desculpa, Lakehal, sei que invadiram a tua casa, tão perto da minha, no Bonfim, com o propósito asqueroso de te espancar. E lamento que da boca de uma deputada tenham ouvido que “é preciso limpar Lisboa dos ratos”, quando o tema em análise era a imigração. Há um cinismo doentio num povo que ao domingo faz questão de pedir perdão ao Criador para, no minuto seguinte, se esquecer da matéria dada. Afinal não somos todos iguais? A minha pele branca não vale mais do que a tua, Wahida, por mais que o digam em grupos de WhatsApp carcomidos pelo ódio.
Lamento, Wagner, se este retângulo à beira mar plantado está tão carregado de incongruências. Precisamos da vossa mão de obra em diversas áreas mas não vos sabemos receber nem orientar. É um salve-se quem puder em apartamentos lotados e em intermináveis filas, ao frio, para tratar de burocracias. E a culpa é vossa, Samira? Ou nossa à boleia da gritante falta de melhores políticas de acolhimento e integração?
Fui feliz ao ver o diretor nacional da Polícia Judiciária a dizer, há dias, com todas as letras, que não há relação entre crime e imigração. Viste, Noah? Nas prisões portuguesas “há 120 pessoas de países asiáticos num universo de mais de 10 mil reclusos”. A desinformação só se cura com informação e se há 10 vozes enganadoras e infames que surgem contra a verdade, haja fôlego e coragem para erguer 20 contra a mentira. O escudo protetor que te dou, Mihai, é a força da minha palavra. Não desistas de mim, por favor, que eu não vou desistir de ti.