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O próximo Quadro Financeiro Plurianual da União Europeia (UE) é decisivo para o nosso futuro coletivo, para a preservação dos valores e modos de vida europeus, devendo a autonomia estratégica da Europa constituir o principal objetivo das suas políticas públicas no período de programação pós-2027.
Recentemente, este objetivo tem vindo a ser reduzido à dimensão militar, com o necessário rearmamento e a menor dependência dos estados-membros da UE dos EUA no quadro da NATO. Nesta perspetiva mais estrita, maior autonomia estratégica é contraditória com outros objetivos das (tradicionais) políticas públicas da UE, como a Política Agrícola Comum (PAC) ou a Política de Coesão. Mas este objetivo pressupõe também e sobretudo menor dependência externa agroalimentar, energética, de matérias-primas e de produtos industriais, bem como cadeias de produção e distribuição mais curtas, explorando o potencial do Mercado Único e apostando na (re)industrialização da UE centrada nas transições energético-ambiental e digital. Nesta perspetiva mais ampla e mais correta, não existe contradição entre maior autonomia estratégica e maior coesão económica, social e territorial.
Neste século, o crescimento económico da UE como um todo muito ficou a dever-se ao crescimento económico das suas regiões menos desenvolvidas, onde o investimento tem efeitos indiretos significativos nas regiões mais desenvolvidas. As profundas transformações, tecnológicas, demográficas e geopolíticas exigem uma Política de Coesão capaz reduzir os custos sociais destas alterações estruturais da economia da UE, não excluindo territórios e cidadãos. Sacrificar a coesão seria alargar a atual geografia do descontentamento e alimentar populismos eurocéticos, colocando em causa as democracias liberais do Ocidente e a construção europeia. Assim, importa: i) manter a coesão económica, social e territorial no centro do projeto europeu; ii) compatibilizar coesão económica, social e territorial e alargamento da UE, através do aumento absoluto e relativo do Quadro Financeiro Plurianual; iii) reforçar os princípios da subsidiariedade e da adicionalidade para a construção de uma agenda da coesão ambiciosa, rejeitando modelos centralizados de gestão, como na aplicação do PRR em Portugal; iv) promover políticas compatíveis com as potencialidades e necessidades de cada território, envolvendo atores locais e regionais no seu planeamento e gestão; v) articular a aplicação da PAC e da Política de Coesão, assegurando complementaridades de financiamentos e aumentando o investimento na fileira agroalimentar e nos territórios rurais e de mais baixa densidade.