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Tendo em conta o período que estamos a atravessar de preparação para as próximas eleições legislativas, fértil em propostas e mesmo em reflexão sobre o nosso futuro coletivo, dei por mim a elaborar sobre o que deveria constar de um bom programa de governo para a saúde.
Para o efeito, alinhei o que deveriam ser grandes prioridades. E para o topo não tive dúvidas: gestão, gestão e mais gestão. Estamos perante muitos recursos, cada vez mais caros e mais escassos. Não é, por isso, aceitável, e devia merecer a mais viva e enérgica repulsa da comunidade, a sua não utilização da forma mais eficiente, mais rigorosa e mais inteligente.
E desses recursos, particular atenção deveria ser dedicada aos humanos, materializada numa prioridade especial à atração, retenção e gestão dos principais ativos de qualquer sistema de saúde: os profissionais que nele trabalham.
Ainda no rol das prioridades, incluem-se também as novas tecnologias. Uma das consequências de na saúde ser tudo mais regulado, regulamentado e avaliado – o que me parece muito bem - é que a modernidade chega sempre tarde. Veja-se o caso paradigmático das tecnologias de informação, onde o atraso face a outros setores é de décadas. Os custos desta realidade são assustadores e nada justifica que assim tenha de ser. Antes pelo contrário, a saúde deve ser a vanguarda do progresso em todas as suas dimensões e não apenas nas que estão relacionadas com as inovações associadas às terapêuticas.
E assim, para dar concretização às três prioridades enunciadas - mais e melhor gestão, atratividade e capacidade de retenção dos melhores recursos humanos e vanguarda na adoção das novas e das emergentes tecnologias –, um plano de ação, claro e arrojado, teria de ser posto em prática.Mais do que a qualidade e o acerto das suas medidas e ações, será fundamental e decisivo reunir as condições para a sua aplicabilidade, onde emerge: a) disponibilidade dos meios financeiros necessários; b) força política e legitimidade; c) capacidade de liderança.
Se a primeira parece assegurada, já quanto à segunda – onde estará o elemento diferenciador - exige-se, além do adequado suporte do chefe do Governo, um pacto, tácito ou explícito, com a sociedade civil. Não é nem será fácil, mas sem força e sem legitimidade já todos vimos o que acaba por acontecer.
Quanto à ação, julgo estruturante a manutenção de uma Direção Executiva para o SNS – sem prejuízo dos ajustes que forem necessários ao seu modelo organizacional para a dotar das melhores ferramentas de gestão, por um lado, e da maior transparência e escrutínio, por outro. O essencial é separar a gestão operacional do SNS da gestão política do Sistema Nacional da Saúde, assegurando o seu alinhamento global em função do superior interesse do cidadão e do doente. Inovação processual disruptiva vai ser necessária para sermos bem-sucedidos na gestão dos recursos humanos, recorrendo, sem hesitação, à excecionalidade face ao que são as práticas da função pública neste domínio, o que passa por integrar o que de melhor se faz noutras realidades, nomeadamente no setor privado.
Com menor disrupção, mas não menos urgência, impõe-se pôr fim à preocupante ausência de uma estratégia nacional – clara, consensual e exequível – para a transformação digital da saúde, que possa guiar e orientar as diferentes iniciativas neste domínio dos principais agentes, a começar pelo estado.