Controlar as fronteiras ou controlar o medo?
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O Governo alemão, apoiado por uma coligação de sociais-democratas, verdes e liberais, decidiu alargar o controlo das suas fronteiras com os países vizinhos, quase todos da União Europeia e do espaço Schengen: França, Suíça, Áustria, República Checa, Polónia, Países Baixos, Bélgica e Dinamarca. A medida não nos espantaria se fosse tomada pelo partido da extrema-direita (AfD, Alternativa para a Alemanha), que ultimamente ganhou ou reforçou posições nas eleições regionais.
As justificações apresentadas pelo Governo alemão revelam que se trata de uma decisão que cavalga o medo de ameaças que vêm do exterior. O medo de perturbação da ordem pública por ativistas islâmicos, o medo da imigração irregular, o medo do tráfico de pessoas, o medo do terrorismo. Porém, percebe-se também a presença do medo do crescimento da extrema-direita nas eleições regionais. Ora, aqueles são, justamente, os medos brandidos, agitados como ameaças, por toda a extrema-direita, não apenas pela AfD. Assistimos, pois, à tomada de decisões políticas, por governos sociais-democratas, que são defendidas por partidos da extrema-direita. E aqui reside o primeiro problema. Partidos do centro, ou da família social-democrata, que incluem na sua agenda política parte da agenda daqueles que procuram combater, revelam uma incapacidade para se distinguir, para se distanciar, para desenhar políticas alternativas filiadas nos valores humanistas e cosmopolitas. É verdade que, do exterior, podem sempre vir ameaças. Mas vêm também inúmeras oportunidades. A União Europeia foi construída como espaço aberto por aqueles que acreditaram que o valor das oportunidades era muito superior ao das ameaças.
A decisão de controlo de entradas nas suas fronteiras é, simultaneamente, uma decisão irrealista que ameaça a economia. Hoje, os principais movimentos de atravessamento das fronteiras dentro da Europa, de pessoas ou de mercadorias, sustentam as dinâmicas da economia de todos os países. Quando se fecham fronteiras, a imagem mais forte e impressiva que nos chega é a das filas intermináveis de camiões, depois do Brexit, que transportam todo o tipo de bens de equipamento e de produtos alimentares. São movimentos de circulação que dinamizam as economias dos países europeus, cada vez mais interdependentes. O controlo das fronteiras da Alemanha terá consequências muito negativas não apenas para a economia alemã, mas para a economia de todos os países da União Europeia.
Olhar o mapa da Europa e ver uma Alemanha que ameaça isolar-se e fechar-se sobre si mesma suscita sentimentos de incredulidade.