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A lamentável expressão utilizada pelo líder da bancada parlamentar do Chega, entretanto caucionada por André Ventura, de que a Polícia não deve ter medo de “disparar a matar”, numa alusão à atuação dos agentes da PSP no caso da morte de Odair Moniz, é apenas uma das várias formas de confrontação encontradas por um partido que se alimenta do ódio e que reduz os problemas à perspetiva infantil dos bons contra os maus. Os maus, no caso do Chega, são sempre os que estão do outro lado da Polícia, independentemente dos factos e do contexto. E os bons são sempre as forças de autoridade, independentemente dos factos e do contexto.
O desejo de “pôr o país na ordem” que André Ventura persegue de forma cega leva à transferência da taberna para a arena política, numa lógica que é tão circense quanto perigosa. Só que defender os polícias não é isto. Defender os polícias é exigir que sejam esclarecidas as circunstâncias que levaram à morte de Odair, e não pedir um louvor para o agente que deu o tiro fatal; defender os polícias é garantir que se apure a responsabilidade criminal (caso haja) desse agente. Mas o Chega não quer defender os polícias. Só pensa em encaixá-los numa trincheira. Na sua.
Porém, a Polícia, como mão musculada do Estado, não deve ter contemplações para com grupelhos que semeiam o caos, destroem propriedade alheia e aterrorizam pessoas inocentes. Mas não é com apelos às armas e ao ódio que se dá moral, ou legitimidade, às forças policiais.
Enquanto continuar a ser o único partido a “defender” a autoridade na sua agenda política, o Chega sentir-se-á legitimado para esticar a corda. Mesmo que o faça fora do reduto da lei, como parece evidente. A isto se chama disparatar a matar.