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Em particular na saúde, mas de uma forma geral relativamente a todos os departamentos da nossa máquina pública, confesso que nunca entendi a disparidade entre a atenção e a mediatização que é dada ao orçamento anual - em cuja discussão o país aparentemente se envolve, numa dimensão quase transcendental, como se, por essa via, todos os problemas que coletivamente nos inquietam fossem encontrar solução -, e o quase inexistente exercício de prestação de contas e de análise dos desvios entre o previsto e o executado, que deveria ocorrer após cada anuidade.
A situação é ainda mais estranha quando, há uns anos a esta parte, têm vindo a ser implementadas políticas ativas de cativações que, tanto quanto julgo saber, se materializam em desvios muito significativos, desde logo nas rubricas de investimento, entre o orçamentado e o efetivamente realizado.
Como muito boa gente tem salientado, a cultura da prestação de contas não está propriamente instalada na nossa forma de estar e muito menos na daquelas entidades e instituições em que esta mais se justifica, como é o caso da administração pública ou do universo de quem depende maioritariamente de fundos públicos.
Assim, o que tenho visto é que os partidos se combatem, de forma por vezes feroz, pelo orçamento, ou seja, por um conjunto estruturado de intenções - instrumento que é obviamente fundamental no nosso ordenamento formal -, e depois, concluída a anuidade, não há, pelo menos com empenho semelhante, a análise e a avaliação do que foi efetivamente feito, não só a nível central, leia-se dos departamentos governamentais, mas também ao nível de cada uma das células deste complicado puzzle que é a coisa pública.
Veja-se a comparação com o que se passa no mundo empresarial onde o foco está na prestação de contas e em particular na análise das mesmas, associada à boa medição dos resultados conseguidos em que, pela sua importância estruturante para a qualidade da gestão, a periodicidade aumenta para o trimestre ou mesmo para o mês.
Com os elevados e em crescimento recursos financeiros, de todos nós, que lhe vêm, todos os anos, sendo atribuídos, no caso particular da saúde, mais do que um exercício de adivinhação que é o orçamento, o que gostaria de conhecer, pelo menos após cada anuidade, era o que com esse dinheiro foi conseguido em termos nacionais, em termos de cada unidade prestadora de cuidados e ao nível de cada serviço.
Dir-me-ão: mas isso já existe! Admitindo que tal é verdade, e que a qualidade da informação em causa é a melhor, a questão que se coloca é então porque não é à volta desses resultados e da sua cuidada análise que o debate se faz?
Infelizmente, julgo que a realidade não será essa. Com efeito, não há na saúde práticas instaladas de medição de resultados, sendo que destes, os que não têm a visão e a perceção do cidadão/doente/cliente no centro, são manifestamente desajustados e, em última análise, pouco úteis.
E aqui chegados, como dizia o conhecido guru da economia, Peter Drucker, a conclusão é implacável e não pode mesmo ser outra: não se pode gerir o que não se mede.